INVESTIGAÇÃO

Ex-comandantes dizem à PF que Bolsonaro apresentou plano de 'golpe de Estado'

Os ex-comandantes do Exército, general Freire Gomes, e da Aeronáutica, Baptista Júnior, reforçam informações dadas por Mauro Cid em investigação sobre suposto plano de golpe de Estado

O Tempo
Publicado em 15/03/2024 às 15:34
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O presidente Jair Bolsonaro, o comandante do Exército, general Marco Antônio Freire Gomes e seu ministro da Defesa, Paulo Sergio Nogueira, durante celebração do Dia do Soldado no quartel-general do Exército, em Brasília (Foto/Evaristo Sá/AFP)

O presidente Jair Bolsonaro, o comandante do Exército, general Marco Antônio Freire Gomes e seu ministro da Defesa, Paulo Sergio Nogueira, durante celebração do Dia do Soldado no quartel-general do Exército, em Brasília (Foto/Evaristo Sá/AFP)

Os ex-comandantes do Exército, general Marco Antônio Freire Gomes, e da Aeronáutica, brigadeiro Carlos Almeida Baptista Júnior, complicaram o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em depoimentos à Polícia Federal (PF). Ambos disseram que o ex-chefe do Executivo não só sabia da chamada “minuta golpista” como apresentou, em reuniões no Palácio do Alvorada, opções de medidas para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que envolviam prisões de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

A equipe de O TEMPO em Brasília teve acesso nesta sexta-feira (15) à íntegra dos depoimentos de Freire Gomes e Baptista Júnior, após o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no STF, tirar o sigilo. O interrogatório aconteceu em 1º de março no âmbito da investigação sobre suposta trama liderada por Bolsonaro e que envolvia generais e ministros para dar um golpe de Estado visando a manutenção do ex-presidente no Palácio do Planalto. 

Os ex-comandantes contaram que Bolsonaro convocou reuniões no Palácio do Alvorada, logo a após a derrota para Lula no segundo turno das eleições de 2022, para apresentar “hipóteses de utilização de institutos jurídicos como GLO (Garantia da Lei e da Ordem), estado de defesa e sítio em relação ao processo eleitoral”. 

Baptista Júnior relatou aos investigadores que Freire Gomes chegou a comunicar que prenderia Bolsonaro caso ele tentasse colocar em prática um golpe de Estado. Por outro lado, o então comandante da Marinha, Almir Garnier Santos, colocou as tropas à disposição ao discutir as minutas apresentadas por Bolsonaro, segundo Baptista Júnior.

Confira abaixo os principais pontos dos depoimentos dos ex-comandantes do Exército e da Aeronáutica:

  • Planos para golpe: O ex-presidente Jair Bolsonaro apresentou, em reuniões no Palácio do Alvorada, três diferentes “institutos jurídicos” que permitiriam uma ruptura antidemocrática após a vitória de  Lula nas urnas, segundo o ex-comandante do Exército, Freire Gomes.
  • As opções de Bolsonaro: Os mecanismos aos quais apresentava como opções para impedimento da posse de Lula eram a decretação de uma Garantia da Lei e da Ordem (GLO), de Estado de Defesa ou de Estado de Sítio, ainda segundo Freire Gomes. 
  • Paulo Nogueira envolvido: Um dos encontros narrados pelo ex-comandante do Exército aconteceu em 7 de dezembro de 2022, quando ele esteve no Palácio do Alvorada a convite do então ministro da Defesa, o também general Paulo Sérgio Nogueira. 
  • Filipe Martins: Nessa mesma reunião, o então assessor especial da Presidência Filipe Martins leu trechos de uma “minuta golpista” que se valia de expressões de uso comum por Bolsonaro, como “jogar dentro das quatro linhas”. Bolsonaro disse que “o documento estava em estudo e depois reportaria a evolução aos comandantes”.
  • A solução de Paulo Nogueira: Em outro encontro relatado por Freire Gomes e ocorrido em 14 de dezembro, Paulo Nogueira apresentou uma nova versão do decreto que viabilizaria um golpe. Nela, também constavam a decretação de Estado de Defesa e a criação de uma Comissão de Regularidade Eleitoral para “apurar a conformidade e legalidade” do pleito de 2022.
  • Reunião com cúpula das Forças Armadas: Houve uma segunda reunião, narrada por Freire Gomes, com a presença dos comandantes das três Forças Armadas. Nela, Bolsonaro apresentou uma versão do documento com a “Decretação do Estado de Defesa” e a criação de uma “Comissão de Regularidade Eleitoral”, para “apurar a conformidade e legalidade do processo eleitoral”.
  • O não de Freire Gomes: Então comandante do Exército, Freire Gomes disse que se opôs “de forma contundente” à proposta, posição que, segundo ele, foi seguida pelo brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior, então comandante da Aeronáutica. 
  • A adesão de Garnier Santos: Já o almirante Almir Garnier Santos, então comandante da Marinha, teria “se colocado à disposição do presidente da República”, conforme depoimento do ex-comandante do Exército. A informação foi confirmada pelo ex-comandante da Aeronáutica.
  • Estevam Theophilo: Freire Gomes contou também que Bolsonaro convocou o general Estevam Theophilo Gaspar de Oliveira, do Comando de Operações Terrestres do Exército (Coter), para um dos encontros no Alvorada em que foram apresentadas as opções para impedir a posse de Lula. 
  • Emprego da força: A unidade comandada por Estevam Theophilo teria como missão no suposto plano golpista “coordenar o preparo e o emprego da força terrestre”, de acordo com Freire Gomes.
  • Anderson Torres: Outro nome citado por Freire Gomes foi o de Anderson Torres. Segundo Paulo Freire, o então ministro da Justiça tinha a função de detalhar “o suporte jurídico para as medidas que poderiam ser adotadas” para o suposto golpe. O general confirmou que uma “minuta golpista” apreendida na casa de Torres trazia o mesmo texto discutido internamente da reta final do governo Bolsonaro.
  • Pressão de militares: Freire Gomes também relatou ter se sentido pressionado por militares da ativa que divulgaram uma carta na qual diziam que estavam “atentos a tudo que está acontecendo” e que provocava “insegurança jurídica e instabilidade política” no país. O texto passava um recado velado: “Covardia, injustiça e fraqueza são os atributos mais abominados para um soldado”. 

Os depoimentos de Freire Gomes e Baptista Júnior reforçam as informações dadas pelo tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, em delação premiada firmada com a Polícia Federal.  

As defesas de todos os citados por Freire Gomes e Baptista Júnior não se manifestaram sobre os depoimentos dos ex-comandantes até a mais recente publicação desta reportagem.

Os crimes que Bolsonaro e aliados teriam cometido, segundo a PF

A PF deflagrou em 8 de fevereiro uma operação que visou buscar provas em investigação que apontam para uma “tentativa de golpe de Estado” em 2022, que estava sendo organizada por aliados de Bolsonaro. 

Para conseguir os 33 mandados de busca e apreensão, as 48 medidas cautelares que podem incluem apreensão de passaporte e/ou proibição de manter contato com os demais investigados, além das quatro ordens de prisão, a PF apresentou à Procuradoria-Geral da República (PGR) um relatório. O documento tem análises de investigadores, com material anexado e apresentado como prova.

O conteúdo inclui mensagens de textos e áudios, além de vídeos dos investigados. Na representação, a PF disse haver indícios de tentativa de que uma “organização criminosa” visava golpe de Estado e planejou a abolição violenta do Estado Democrático de Direito. 

  • A tentativa de golpe de Estado é considerada crime, com pena que varia de 4 a 12 anos de prisão, além da punição correspondente à violência empregada para a busca de tomada do poder – ou permanência no poder, caso a intenção seja beneficiar quem está nele.
  • Já a tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito ocorre quando alguém atua com violência ou grave ameaça para impedir ou restringir o exercício dos poderes constitucionais, como o STF. A punição vai de 4 a 8 anos de prisão, além da pena relativa à violência usada.

Fonte: O Tempo

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