Aos poucos elas serão silenciadas, deixando as marcas do mau gosto sonoro da Copa de 2010, assim como Mick Jagger
Aos poucos elas serão silenciadas, deixando as marcas do mau gosto sonoro da Copa de 2010, assim como Mick Jagger deixou estigmatizado o seu pé frio até assistir ao jogo na torcida da Alemanha. Na verdade, naquele dia ele torceu contra o Brasil, e nós o elegemos como o culpado, porque na perda sempre haverá alguém a quem culpar. Se não fosse o seu filho, ele estaria na torcida holandesa. Todavia, as vuvuzelas e as jabulanis foram as surpresas desta Copa, ambas cravejadas de críticas.
Os pontos positivos são os atos contra o racismo, em meio à diversidade étnica cultural que se faz presente em jogos mundiais. Às vezes, nós, brasileiros, subestimamos o poder devastador do racismo, reduzindo-o a piadinhas de mau gosto, que alguns, em sua maioria, riem da desgraça daqueles que sabem o que é ser discriminado, não obstante a possível ascensão social. Entretanto, o seu combate se faz necessário, não só na terra de Mandela, mas em qualquer esfera. Combater a intolerância e erradicar gestos religiosos nos campos de futebol é tão premente como combater rivalidades históricas.
Desnecessário falar do time brasileiro, nós brasileiros sabíamos a barca que entramos, porém, o poder de fogo da mídia e o poder dos patrocinadores nos envolveram no véu da ilusão, que se encerrou na decepção do que já se sabia. Essa Copa deixará algumas lições, entre elas, que o intercâmbio mercantilista no futebol não forma uma seleção, nem no Brasil nem na Itália. Que rezas e simpatias não anulam talentos, e que é preferível a discrição ao talento ranzinza ou afetuoso por demais. Entretanto, futebol é um campo fértil às mazelas humanas, que dali desdobram-se para outros gramados urbanos onde os homens convivem sem chuteiras e caneleiras.
Porém, esses desdobramentos podem acirrar o racismo, potencializar a violência, obtusar os gestos inconsequentes, nutrir rivalidades desnecessárias. É preciso ficar atento à rivalidade, nutrida pelos meios de comunicação, entre Brasil e Argentina, onde a desgraça de um é a alegria do outro, ou se não posso ser vitorioso o outro também não poderá. É uma rivalidade provinciana nutrida desde a época em que a Argentina batia todos os índices de desenvolvimento humano na América Latina e o Brasil sempre liderava como sendo um dos últimos. Porém, esquecemos esta disputa para disputar aquilo que não interfere em nossas vidas, ou seja, uma decisão de partida de futebol.
O futebol acarinha o ódio da mesma forma que dá contorno de patriotismo. Depois, após enterrar os penalizados, não se sabe o que fazer, portanto é preferível esquecer a erradicar. O futebol pós-década de 70 foi severamente criticado por alguns intelectuais que se diziam comprometidos com a libertação social do país, viam no futebol o mecanismo da alienação social manipulada politicamente, ideias de uma época. O que se sabe é que o futebol é capaz de embriagar os seus ídolos, que pensam que podem tudo; narcotiza torcedores, que depositam o seu sucesso pessoal em seu time. Por isso toda escuridão é resultado da obsessão, que penaliza equivocadamente.
(*) professor