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Vuvuzelas

Aos poucos elas serão silenciadas, deixando as marcas do mau gosto sonoro da Copa de 2010, assim como Mick Jagger

Gilberto Caixeta
Publicado em 06/07/2010 às 21:00Atualizado em 20/12/2022 às 05:31
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Aos poucos elas serão silenciadas, deixando as marcas do mau gosto sonoro da Copa de 2010, assim como Mick Jagger deixou estigmatizado o seu pé frio até assistir ao jogo na torcida da Alemanha. Na verdade, naquele dia ele torceu contra o Brasil, e nós o elegemos como o culpado, porque na perda sempre haverá alguém a quem culpar. Se não fosse o seu filho, ele estaria na torcida holandesa. Todavia, as vuvuzelas e as jabulanis foram as surpresas desta Copa, ambas cravejadas de críticas.

Os pontos positivos são os atos contra o racismo, em meio à diversidade étnica cultural que se faz presente em jogos mundiais. Às vezes, nós, brasileiros, subestimamos o poder devastador do racismo, reduzindo-o a piadinhas de mau gosto, que alguns, em sua maioria, riem da desgraça daqueles que sabem o que é ser discriminado, não obstante a possível ascensão social. Entretanto, o seu combate se faz necessário, não só na terra de Mandela, mas em qualquer esfera. Combater a intolerância e erradicar gestos religiosos nos campos de futebol é tão premente como combater rivalidades históricas.

Desnecessário falar do time brasileiro, nós brasileiros sabíamos a barca que entramos, porém, o poder de fogo da mídia e o poder dos patrocinadores nos envolveram no véu da ilusão, que se encerrou na decepção do que já se sabia. Essa Copa deixará algumas lições, entre elas, que o intercâmbio mercantilista no futebol não forma uma seleção, nem no Brasil nem na Itália. Que rezas e simpatias não anulam talentos, e que é preferível a discrição ao talento ranzinza ou afetuoso por demais. Entretanto, futebol é um campo fértil às mazelas humanas, que dali desdobram-se para outros gramados urbanos onde os homens convivem sem chuteiras e caneleiras.

Porém, esses desdobramentos podem acirrar o racismo, potencializar a violência, obtusar os gestos inconsequentes, nutrir rivalidades desnecessárias. É preciso ficar atento à rivalidade, nutrida pelos meios de comunicação, entre Brasil e Argentina, onde a desgraça de um é a alegria do outro, ou se não posso ser vitorioso o outro também não poderá. É uma rivalidade provinciana nutrida desde a época em que a Argentina batia todos os índices de desenvolvimento humano na América Latina e o Brasil sempre liderava como sendo um dos últimos. Porém, esquecemos esta disputa para disputar aquilo que não interfere em nossas vidas, ou seja, uma decisão de partida de futebol.

O futebol acarinha o ódio da mesma forma que dá contorno de patriotismo. Depois, após enterrar os penalizados, não se sabe o que fazer, portanto é preferível esquecer a erradicar. O futebol pós-década de 70 foi severamente criticado por alguns intelectuais que se diziam comprometidos com a libertação social do país, viam no futebol o mecanismo da alienação social manipulada politicamente, ideias de uma época. O que se sabe é que o futebol é capaz de embriagar os seus ídolos, que pensam que podem tudo; narcotiza torcedores, que depositam o seu sucesso pessoal em seu time. Por isso toda escuridão é resultado da obsessão, que penaliza equivocadamente.

(*) professor

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