ARTICULISTAS

Peso do próprio sucesso

Tenho pensado, nestes dias que se sucederam à morte de Michael Jackson, sobre trajetórias de vidas que teriam tudo para ser vitoriosas e, de repente, tomam rumo inesperado e triste

Terezinha Hueb de Menezes
Publicado em 18/07/2009 às 20:31Atualizado em 20/12/2022 às 11:36
Compartilhar

Tenho pensado, nestes dias que se sucederam à morte de Michael Jackson, sobre trajetórias de vidas que teriam tudo para ser vitoriosas e, de repente, tomam rumo inesperado e triste.

Na televisão, foi-se alterando o rosto jovial de uma criança saudável, cantando com os irmãos, sob o jugo, dizem, de um pai déspota. O rosto foi sofrendo modificações drásticas, na cor e nas feições: chegou um tempo em que não se via no novo semblante nada que lembrasse o antigo. Era outro.

Mas nos gestos, no talento, na arte, continuava uma estrela em ascensão constante.

E me pergunto sobre as causas que provocam transformações tão significativas, em uma pessoa que sai do anonimato para a condição de estrela mundial.

São muitos os traumas de uma infância feita de cobranças desmedidas. São muitas as influências que arrastam modos de agir e ser. São muitas as cobranças da mídia que compara, critica, exige, humilha, exalta, num emaranhado de ações que, com certeza, cria sentimentos díspares na cabeça de qualquer pessoa. São os fãs enlouquecidos, que também enlouquecem o artista idolatrado, com isso dele exigindo mais e mais, na superação a cada passo, a cada movimento, como se o sucesso fosse um animal voraz a consumir-lhe as entranhas.

Pobre Michael Jackson, vítima da ganância da família, vítima da instrumentalização a que o submeteram, vítima, talvez, da própria identidade. Tornou-se coisa, objeto nas mãos de pessoas inescrupulosas.

Quais os motivos, perguntamos?

Seria tudo resultado de uma personalidade fraca, incapaz de suportar o sucesso e o poder, as multidões de fãs, os seguidores de seu talento, sem condição de parar, de analisar a própria vida, de tomar rumos que não o atormentassem tanto? Seria a infância não-vivida, (“chorava ao relembrar a infância”), dobrada sempre na necessidade de fazer brotar a criança que ficara lá atrás, nos folguedos roubados, nas frustrações de não haver tido o direito de ser criança? “...durante sua infância chorou várias vezes de solidão e muitas vezes vomitava só de ver seu pai.”

Em torno de sua vida e personalidade, verdades, mentiras, mitos e pressões de toda espécie. Com isso, o uso descontrolado de remédios, agredindo o organismo e comprometendo a mente. Era preciso descansar, dormir; era preciso calar as dores; era preciso ficar desperto; era preciso dormir e descansar de novo, era preciso...era preciso...

O que se passava na cabeça do ídolo de tantas campanhas humanitárias, na preocupação com problemas de toda sorte, comprimindo seres necessitados? Com certeza, o temor de uma carga bem superior à que seus ombros poderiam suportar. “Os ombros suportam o mundo” (CDA). Os dele não suportaram a própria vida, transformada em instrumento de exploração e ganhos financeiros.

Como Michael Jackson, outros: Marilyn Monroe, Elvis Presley. Vidas que cederam sob o peso do próprio sucesso e da incapacidade de conviver com personagens (em que se transformaram), roubando-lhes a identidade, talvez escondida no escaninho da memória e do coração.

(*) educadora do Colégio Nossa Senhora das Graças e membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Logotipo JM Magazine
Logotipo JM Online
Logotipo JM Online
Logotipo JM Rádio
Logotipo Editoria & Gráfica Vitória
JM Online© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por