Decisões recentes da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal vêm sinalizando uma possível nova mudança...
Decisões recentes da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal vêm sinalizando uma possível nova mudança de entendimento da Corte Suprema quanto à possibilidade de execução da pena após o julgamento em segunda instância.
A admissão da execução da pena após o esgotamento das instâncias ordinárias é, tradicionalmente, entendimento prevalecente no Supremo, desde antes e já na vigência da Constituição de 1988.
Todavia, ele foi alterado em 2009, forte no argumento da presunção de inocência (HC 84.078/MG), tendo perdurado até fevereiro de 2016, quando o tribunal voltou ao seu anterior entendimento (HC 126.292/SP), reafirmado em novembro do mesmo ano (ARE 964.246).
O princípio da presunção de inocência, ou da não culpabilidade, configura direito individual fundamental do acusado em face da persecução penal efetivada pelo Estad enquanto não finalizado o exame dos fatos e das provas, deve ele ser considerado inocente.
A condenação criminal após o esgotamento das instâncias ordinárias, isto é, julgamento do caso pelo juiz de primeiro grau seguido da revisão pelo Tribunal de Apelação, importa no exaurimento do exame dos fatos e das provas, com a imputação da responsabilidade penal ao indivíduo. A partir daí somente cabem recursos de natureza extraordinária, de fundamentação vinculada, que não discutem fatos e provas, mas apenas, estritamente, questões de direito, como são os casos do recurso especial ao Superior Tribunal de Justiça e do recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal.
O condenado em segunda instância, pois, não mais é inocente: a discussão quanto à sua responsabilidade penal é exaurida, permeada pela garantia do duplo grau de jurisdição. A partir daí, devem prevalecer, em face do princípio da presunção da inocência, os postulados da efetividade da jurisdição e da razoável duração do processo, e ainda o direito da coletividade à segurança pública.
Note-se que apenas cerca de 5% dos recursos extraordinários e ordinários são providos. E eventuais ilegalidades no acórdão do tribunal de apelação podem ser, sempre, enfrentadas via medidas cautelares e habeas corpus.
Aguardar o julgamento de recursos de natureza extraordinária, não raro de caráter protelatório, e por anos a fio, para só então executar a pena é favorecer a impunidade, não apenas pela demora, mas também pelo risco de prescrição. Se assim fosse, nos processos da Lava-Jato, por exemplo, dificilmente os envolvidos firmariam acordos de colaboração premiada, inviabilizando o alcance de meios de obtenção de provas de crimes graves e a recuperação de recursos públicos desviados.
A possibilidade de execução da pena, inclusive de prisão, após o esgotamento das instâncias ordinárias, pois, é alicerce para a efetividade do combate à corrupção. Ademais, propicia que condenados por outros crimes graves, como homicídios, latrocínios e tráfico de drogas, delitos que atormentam seriamente a sociedade brasileira, iniciem o cumprimento de suas penas de forma mais célere.
Rever, sem qualquer fato novo e à revelia de precedentes recentes da Corte Suprema, a possibilidade de prisão do condenado criminalmente após o julgamento em segunda instância significaria grande retrocesso, justo no momento em que a Justiça Criminal alcança pessoas historicamente inatingíveis pelo sistema.
(*) Procurador da República em Uberaba