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O afeto utilizado para reconhecimento da relação parental

As transformações que ocorreram quanto ao reconhecimento da filiação percorreram um caminho sinuoso no início...

Mônica Cecílio Rodrigues
Publicado em 14/05/2018 às 11:04Atualizado em 16/12/2022 às 01:34
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As transformações que ocorreram quanto ao reconhecimento da filiação percorreram um caminho sinuoso no início, não valorizando o afeto, e agora com uma nova roupagem, a filiação vem tomando formas do verdadeiro significado da relação parental – o afeto.

De início os filhos aceitos legalmente eram somente os nascidos na constância do matrimônio, sendo que a existência do casamento blindava o hipotético pai de responder por uma ação de investigação de paternidade, quando ainda não se ventilava a existência do exame pericial conhecido popularmente com o nome de DNA.

A solução mediada entre os civilistas era, através do testamento, garantir aquele excluído pela lei, além do reconhecimento o também direito à herança, concorrendo com seus outros meio-irmãos já registrados. Mas, mesmo que direitos sucessórios eram apenas pela metade dos filhos outrora denominados de legítimos.

Um paliativo para a proibição legal que distinguia os filhos havidos fora do matrimônio.

Condensando toda a longa e sinuosa história por que passou a filiação, posteriormente, com o surgindo do exame de DNA e com a possibilidade trazida pela Constituição Federal de 1988, os filhos havidos por relações que não matrimoniais tinham direitos iguais, quer seja direitos filiais, quer seja direitos sucessórios, aos seus meios irmãos nascidos do casamento.

E recentemente, surge a aceitação de uma família constituída no afeto, de relações então criadas, mesmo que sem qualquer liame sanguíneo ou civil (adoção), mas apenas socioafetiva.

Atualmente, aquele modelo pré-concebido de filiação consanguínea ou filiação registral vem sendo acrescida a família socioafetiva e mais a possibilidade desta dupla existência de paternidade em um mesmo registro de nascimento. Melhor dizendo, o registro do pai biológico coexistindo com o registro do pai afetivo. Criando duplos direitos filiais e sucessórios, desde que assim seja do desejo de cada qual.

Esta possibilidade de múltiplos vínculos parentais ampara no princípio da paternidade responsável, sendo resultado de um emblemático julgamento na Corte Constitucional Brasileira. E que deverá ser aplicado a todos os julgamentos que contenha este pedido.

Os óbices legais anteriormente existentes ao reconhecimento da filiação hoje não mais persistem, muito pelo contrário, a facilitação é resultado da aceitação e valoração do afeto na existência da família.

Em uma crítica bastante severa as interferências do Estado, a Corte concede ao cidadão a possibilidade de buscar a sua própria felicidade, não permitindo que seja barrado por “modelos pré-concebidos” de família pela lei ou deixar ao desabrigo “arranjos familiares alheios a regulamentação estatal”.

E este gesto, denota a força do Poder Judiciário na proteção ao cidadão que busca legalizar a filiação afetiva, que por vezes é mais forte do que a biológica.

A realização da coexistência da paternidade biológica com a afetiva, ou da adotiva com a afetiva deve acolher ao melhor interesse da criança, juntamente com o direito do genitor à dupla declaração da paternidade.

E finalizando, magistralmente, a Corte fixa a tese jurídica, devendo então, conforme a legislação processual determina, ser aplicada a casos semelhantes que requeiram esta tutela jurídica: “A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com todas as suas consequências patrimoniais e extrapatrimoniais”.

Agora é acompanhar e aguardar se realmente os órgãos judiciais subordinados a mais Alta Corte Nacional irão honrar a nobre função de judicar, aplicando este resultado nos casos análogos.

Dra. Mônica Cecílio Rodrigues – advogada, doutora pela PUC-SP e professora universitária.

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