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Renato Muniz Barretto de Carvalho
Publicado em 16/05/2022 às 19:29Atualizado em 18/12/2022 às 22:35
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Quando eu era criança, minha tia dizia que no futuro todo mundo iria ficar surdo. Acho que já estamos beirando o futuro de que ela falava. Ainda escuto alguns sons, as palavras, algumas músicas, as insistentes buzinas, sirenes, etc., mas confesso que está cada vez mais complicado. Meu pai, quando queria descansar, mas estávamos ouvindo um rock pesado na vitrola, vinha com a história da surdez do compositor Beethoven. Ele dizia que o genial autor de “Sonata ao Luar” e muitas outras composições magníficas tinha ficado surdo de tanto ouvir música alta. Aceitávamos o argumento, mesmo porque não tínhamos muitas referências sobre o Sr. Beethoven.

Hoje, tenho certeza de que, se alguém merece uma distinção, tipo uma medalha de honra ao mérito, uma condecoração ou homenagem, é a pessoa que consegue conviver com os outros sem gritar, berrar ou rugir, sem espalhar ruídos incômodos e inconvenientes mundo afora. Pense numa pessoa que consegue transmitir uma ideia com ponderação, com mansidão, que não precisa esgoelar para defender seus pontos de vista. Esta é a pessoa digna de receber as glórias do nosso tempo. É alguém que presta relevantes serviços ao entendimento entre os habitantes do planeta, que se compromete com a promoção da paz mundial.

Os que verdadeiramente gostam de animais não gritam, eles sussurram, são calmos, pacientes. A pessoa que consegue abordar animais bravos sem agressões, sem os irritar, cria vínculos, ganha sua confiança. Já ouvi dizer que não se deve aproximar de um enxame de abelhas com medo, gesticulando demais, falando alto. Já me aconselharam a não demonstrar medo ou agressividade nem gritar diante de um cão nervoso. Sábios conselhos! E entre nós, humanos, valem as mesmas recomendações?

O grito pode agredir, e não só aos ouvidos sensíveis. Não dá para fazer um pedido de namoro ou de casamento aos berros. O resultado vai ser um fora, provavelmente um sonoro “não”. É desagradável conversar com a pessoa amada em voz alta, alterada. Professores que gritam cansam seus alunos, dificultam a aprendizagem, são ineficazes e até contraproducentes, serão lembrados com desprezo.

Quer coisa mais deplorável do que gritar no trânsito? É bobagem esbravejar com alguém que se esqueceu de ligar a seta ou que brecou de supetão. Pode ser descortês, perigoso, mas pra que ofender o camarada, ficar bravo, fazer gestos indecorosos? E nas festas? Tem gente cuja conversa se escuta de longe. É difícil existir algo tão chat as asneiras ao léu, para todo mundo escutar. Que constrangimento!

Mas não sou intransigente contra o grito. Ele é imprescindível para advertir os que se recusam a ouvir os pleitos, as súplicas e as reivindicações dos necessitados. Às vezes, só um grito bem alto e coletivo para intimidar os poderosos e despertar a sociedade contra as injustiças existentes.

Renato Muniz B. Carvalho

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