ARTICULISTAS

As mães são árvores de raízes firmes

Olga Maria Frange de Oliveira
Publicado em 11/05/2021 às 20:48Atualizado em 19/12/2022 às 03:51
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Hoje, segundo domingo de maio, passei mais um “Dia das Mães” sem a presença da minha mãe. Desde a hora que acordei, as lembranças de uma vida inteira de convivência afloraram à minha mente e trouxeram uma saudade imensa de tudo que vivemos juntas.

Eu adorava ver minha mãe no cenário que ela tinha criado para si mesma no seu pequeno e aconchegante apartamento. Como ela se apegou a este apartamento! Era o primeiro imóvel verdadeiramente seu, pois até então ela sempre tinha morado em casas alugadas. Dela herdei o gosto de arrumar a casa, decorando cada canto com carinho, para que minha casa se pareça comigo. Mas não me esqueço nunca de que nada é permanente, tudo muda, decompõe-se, estraga, acaba ou simplesmente morre. Dessa forma, procuro não me apegar a nada. Mesmo assim, preocupa-me a belíssima mobília de sala de jantar que herdei de minha mãe, toda em jacarandá maciço, finamente entalhado e com puxadores de alabastro. Tenho consciência de que na vida moderna não há mais tempo para limpar tapetes persas, polir pratarias e lavar copos e taças frágeis de cristal, nem tampouco espaço para móveis antigos grandes e pesados e muito menos um piano. Tenho certeza de que nenhum dos meus sobrinhos se interessará por esses móveis. Mas, para mim, cada peça tem um significado muito especial, pois está impregnada de doces lembranças de um tempo em que a família estava unida e feliz. A sala de jantar era o orgulho de minha mãe. Foi comprada por meu pai quando o casal estava montando a casa onde iniciaria sua vida conjugal. Escolhida com muito critério pela jovem noiva, com carta branca para efetuar a compra. De qualquer maneira, estou fazendo a minha parte ao zelar por tudo com muito carinho. Devo isso a ela.

Nos últimos anos de vida, quando precisava de assistência para tudo, até para a higiene pessoal, minha mãe continuava vaidosa. Nunca saia de casa, pois afirmava que jamais daria “espetáculo público” andando em cadeira de rodas. Aos 88 anos, olhava-se no espelho com satisfação e dizia: “Acho que não estou mal, apesar da idade não tenho rugas. As minhas amigas e as pessoas da família que vêm me visitar estão todas com a pele igual a um jenipapo. Todas com cara de cem anos!

Mamãe passava diariamente seu creme facial “Nutraderm”, usava lápis para contorno das sobrancelhas e batom 24 horas por dia. Isso mesmo, dormia de batom. Só usava sabonete de glicerina tradicional da “Granado” e adorava camisolinhas curtas de algodão, para deixar à mostra suas pernas bem torneadas. Criticava veementemente os vestidos longos que a maioria das mulheres usa durante o dia. “Deus me livre de arrastar “vestidão”! Cruz credo! Odiava calça comprida, pois “não era travesti”. Gabava-se de nunca ter usado calça comprida, short, bermuda ou maiô. “Mulher direita não usa nada disso”.

Gostava de ensinar suas visitas a tratar da beleza. Ensinava ginásticas faciais, movimentos corretos para passar o creme no rosto, ginásticas corporais para fazer em casa, boas para a coluna e para diminuir a barriga. Sem nenhum constrangimento, dizia: “Quer ficar bonita e conservada como eu? Então, preste atenção!!!” De minha mãe herdei a vaidade. Gosto da rotina de me arrumar toda manhã, mesmo passando a maior parte do tempo fechada em casa nesses tempos de pandemia. Ninguém me vê, mas eu me vejo.

As lições inesquecíveis da rigorosa “escola” de minha mãe foram muito úteis, pois forjaram meu caráter e me ajudaram a seguir em frente em momentos de grande adversidade. Mesmo estando em cima de uma cama, impossibilitada de se locomover, o que mais a distraia era cantarmos juntas as músicas do passado que ela mais gostava, com “O destino desfolhou”, “Casinha pequenina”, “Cabecinha no ombro”, “Bandeira Branca”, e muitas outras. Apesar de “linha-dura”, mandona mesmo, era bem divertida e vivia contando piadas, muitas já bem batidas e repetidas ad infinitum. Mas era um gosto vê-la feliz, apesar de tudo.

Ah! Nunca mais poder estar com minha mãe! Nunca mais! Mas tenho certeza de que Olga-mãe foi feliz ao lado do marido e de seus três filhos. Alegro-me por ter demonstrado com minhas atitudes, minha presença, minha paciência e minha dedicação, que ela era fundamental.

Este é o quinto “Dia das Mães” sem a presença dela. A perda de nossa mãe nos traz uma sensação devastadora de solidão. Como disse o jornalista Arthur Dapiève: “É como se, antes do acerto de contas com o Criador, tivéssemos de acertar as contas com a nossa Criadora”. Feliz Dia das Mães, mommy! Onde quer que a senhora esteja, D. Olga, minha querida e inesquecível mãe, você me faz muita falta!

Olga Maria Frange de Oliveira - Professora de piano, maestrina, regente do Coral Artístico Uberabense, autora do livro “Pioneiros da História da Música em Uberaba” e ex-Diretora Geral da Fundação Cultural de Uberaba

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