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A simultaneidade de relações familiares

Mônica Cecílio Rodrigues
Publicado em 22/02/2021 às 07:43Atualizado em 18/12/2022 às 12:15
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A regra no direito brasileiro é bem clara quando preceitua a possibilidade do reconhecimento da entidade familiar através da união estável entre cidadãos, desde que configurada a convivência pública, contínua e duradoura, com o objetivo de constituição de família; entretanto, não poderá ser reconhecida caso quando haja algum impedimento para o casamento.

E criando uma exceção à regra acima preceitua mais que se as pessoas forem ainda casadas, mas se já estiverem separadas de fato ou judicialmente é permitida a formação da união estável, com o seu devido reconhecimento judicial.

Desconhecida por alguns esta exceção legal, ao fim e ao cabo, com o falecimento de um dos conviventes é perquirida na justiça as benesses juntamente para aquele cônjuge que ficou viúvo, posto que ainda não separado judicialmente, ou que está apenas separado de fato.

E assim, podemos encontrar várias situações em que o patrimônio amealhado durante o casamento coexistente com a união estável é disputado entre o cônjuge viúvo e o companheiro (a) sobreviventes da união estável; sendo que nesta disputa inclua não só o patrimônio, mas também os benefícios previdenciários.

Todo este problema foi criado pela permissividade das regras em nosso país de não exigir para a constituição da união estável ao menos a dissolução da sociedade conjugal, ou seja, a separação judicial.

A lei é bem clara, se os cônjuges estiverem separados de fato podem sim constituir união estável.

O que sem sombra de dúvida acaba desaguando no poder judiciário várias situações fáticas onde se perquire a divisão de patrimônio e também dos benefícios previdenciários de famílias coexistentes, pelo casamento e pela união estável.

Com algumas propostas apresentadas de modificação na lei para que não seja permitida o reconhecimento da duplicidade de núcleos familiares temos muito a considerar.

É de bom alvitre perceber que a informalidade criada pela lei quando da constituição da união estável cria vários problemas sequenciais e que vão desaguar na justiça com o falecimento de um dos conviventes.

A lei é precisa quando fala na permissão para a constituição da união estável posterior ao casamento, mesmo que ainda não dissolvida a sociedade conjugal, ficando claro que não permite a coexistência de duas famílias. Contudo, foram alguns julgados que acabaram por dividir o patrimônio entre os requerentes sobreviventes e bem como a pensão previdenciária, flexibilizando a regra legal.

O que devemos atentar é que a lei não permite a coexistência das famílias, constituídas, quer seja pelo casamento e posterior união estável ou vice e versa.

A proteção legal aos menos favorecidos não pode atingir alguns princípios salutares do direito de família, a exemplo de proibição de coexistência de vários tipos de família entre as mesmas pessoas, a monogamia, em razão da presunção da paternidade, dentre outros.

A prova da existência de uma união estável posterior ao casamento que ainda não foi desconstituído legalmente acaba pesando nesta questão, haja vista que a lei não exige documentos de constituição, restando então a possibilidade na mais delicada das provas – a testemunha. O que fragiliza sobremaneira a prova do início de união estável sequencial ao casamento, colocando dúvidas sobre estar correto ou não a partilha de alguns bens entre todos os envolvidos.

De nada adianta a permissividade legal para a constituição da família se posteriormente esta benesse vai acabar criando dificuldade para aqueles que pretendem buscar a solução de seus direitos, seria dar com uma mão e retirar com a outra. O que não é “legal”!

Mônica Cecílio Rodrigues é advogada, doutora em processo civil pela PUC-SP e professora universitária. 

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