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O limite da responsabilidade conjugal por dívidas do consorte

Mônica Cecílio Rodrigues
Publicado em 02/08/2021 às 17:19Atualizado em 18/12/2022 às 15:16
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Algumas das questões mais controvertidas levadas a apreciação do Poder Judiciário dizem respeito ao descumprimento das obrigações financeiras que dizem respeito aos direitos de família.

E neste cenário podemos encontrar o limite da responsabilidade do cônjuge para com as dívidas de seu consorte, em razão do regime de bens.

Inúmeras são as vezes que já foi pontuado, nesta coluna, a importância de se conhecer, previamente, os regimes de bens quando as partes contraem matrimônio ou até mesmo constituem uma união estável.

Em um julgado recentíssimo, a Corte Superior, apreciando o pedido de penhora feito pelo credor sobre os ativos financeiros do cônjuge do devedor, entendeu por sua inadmissibilidade, mesmo sendo o casamento subordinado ao regime de comunhão parcial de bens; ao fundamento de que não se pode imputar a solidariedade, quando este cônjuge não participou do cumprimento de sentença, ou seja: da formação do crédito ocorrido por sentença.

A decisão do Superior Tribunal de Justiça merece consideração, pois a bem da verdade, não se pode imputar a solidariedade financeira “de forma automática” entre os cônjuges em razão do regime de bens; simplesmente porque, mesmo o regime de comunhão universal de bens comporta exceções quando as obrigações financeiras contraídas e de autoria de apenas um dos consortes.

Maior razão de cuidadosamente assim o fazer no regime de comunhão parcial de bens, onde as exceções são maiores.

E no caso em julgamento este era o regime!

As exceções contidas da legislação civil que determinam a exclusão de bens a serem partilháveis blindam o outro consorte de qualquer possível divisão e até mesmo responsabilidade no que diz respeito a estes bens. Assim, entende-se que não é simplesmente por força do regime de bens que o casamento imputaria aos cônjuges a solidariedade quanto as obrigações assumidas por apenas um deles.

Acrescendo a tudo isto, as regras do processo civil devem ser respeitadas em qualquer das circunstâncias que envolvam as partes, a exemplo da ampla defesa e do contraditória, sob pena de executar obrigações contra pessoas que não foram partes no processo.

E no caso levado a julgamento verifica-se que a obrigação foi reconhecida por sentença, por obvio, através de um processo judicial, valendo ressaltar que o outro cônjuge não participou.

Destarte, impor a este cônjuge que não fez parte da constituição da obrigação a responsabilidade de pagamento, através da penhora de seus ativos financeiros, seria um desrespeito enorme as normas que regem o processo civil e as suas garantias constitucionais. Mesmo que, posteriormente, sua oposição pudesse ocorrer através da defesa correta – embargos de terceiros – sobrecarregando o consorte não devedor de uma prova dificílima e até mesmo impossível – a prova negativa.

Ainda que fique caracterizada a falta de bens para responder pela dívida contraída pelo consorte devedor não pode recair sobre a meação daquele que não a constituiu; ainda mais quando se restou evidenciado no processo que a dívida contraída não foi revertida em prol da família, uma vez que esta prova coaduna mais com a possível produção do que exigir do credor a prova de que o consorte do devedor, quando não houver solidariedade, está a ocultar bens.

A proteção legal do cônjuge do executado tem duas naturezas: a processual, vez que não participou do processo de constituição da dívida e a material, vez que a dívida não sendo em prol da família, a sua meação está protegida.

Mônica Cecílio Rodrigues é advogada, doutora em processo civil pela PUC-SP e professora universitária

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