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A tão propalada prestação de contas e a modalidade da guarda

Mônica Cecílio Rodrigues
Publicado em 13/09/2021 às 09:31Atualizado em 19/12/2022 às 01:59
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A legislação brasileira com vistas a proteger o menor alimentando e baseando no exercício do direito-dever do genitor, que não possui a guarda, positivou em 2014 a possibilidade de ajuizamento da ação de prestação de contas para fiscalizar a utilização dos valores pagos a título de alimentos.

É preciso esclarecer que o objetivo desta ação de prestação de contas foge do ponto comum, pois não é encontrar saldo devedor como usualmente é utilizado para futuro ressarcimento; e nem poderia ser dada a característica de irrepetibilidade da prestação alimentar; mas sim para apurar a verdadeira utilização da prestação alimentícia recebida e assim objetivar o seu melhor aproveitamento, tudo em benefício do menor. Pois se concluído que os alimentos não foram bem utilizados pode desaguar futuramente em uma ação de modificação de guarda ou até mesmo suspensão, chegando em casos extremos a extinção do poder familiar por malversação do valor alimentar recebido por aquele genitor que detém a guarda.

Pois bem, a legislação é muito clara quando permite a utilização da ação de prestação de contas quando a guarda é unilateral, pelo genitor alimentante.

Daí, surgem os imbróglios fáticos que são lavados a Justiça para apreciação. E em recente julgado apresentado a Corte Superior, contrariando a letra fria da lei, foi ajuizada uma ação de prestação de contas, mas a guarda era compartilhada.

A legislação é clara ao permitir a possibilidade da ação de prestação de contas quando a guarda é unilateral.

O objetivo da proteção legal concedida ao genitor que paga alimentos é aferir mesmo se os valores destinados ao menor alimentado esta sendo bem empregado e de acordo com as necessidades do infante, jamais para dar guarida a discórdia passada ou até mesmo alimentar rusgas pré-existentes e que nada dizem sobre o menor.

Caberá ao julgador separar o joio do trigo mesmo, pois aos que militam com o direito de família muito bem sabem que o fator emocional está sempre a flor da pele e muito pode influir na propositura de ações judiciais.

Ao que se denota o julgador quer, neste caso, a prova de algum prejuízo ou até mesmo dano sofrido pelo menor no que diz respeito de sua educação, saúde física ou psicológica do alimentado, o que pode caracterizar malversação do dinheiro recebido a título de alimentos.

A ação de prestação de contas, quando se trata de verba alimentar, o objetivo modifica um pouco da regra comum, pois não se trata de criar um crédito para futura devolução, mas sim exigir como está sendo feito a utilização do valor recebido a título de alimentos para o menor, mas repete-se no caso de guarda unilateral.

E o caso apresentado a julgamento tratava-se de guarda compartilhada e mais, o genitor, autor da ação, objetivava a demonstração de que a genitora estava utilizando os seus vencimentos próprios não em prol do menor, mas em atos outros que sopesados entendia ser o autor da ação de menos importância do que as necessidades do menor.

Por vezes, as questões familiares trazem peculiaridades e narrativas fáticas que vão muito além do direito que a parte alega proteger, mas sim, rusgas passadas e ingerências sobre a vida pessoal, que extrapolam o direito como genitor.

A exigência primordial para o êxito da ação de prestação de contas, no caso de alimentos, deve ser a verificação de que a utilização destes alimentos recebidos foram para o melhor interesse do menor e não perquirir a utilização dos ganhos do outro genitor quando a guarda é compartilhada.

O direito fiscalizatório do genitor que paga alimentos é sobre o valor pago a título de alimentos; quando a guarda exercida é compartilhada espera-se que o acompanhamento diário do menor seja feito com as devidas responsabilidade de cada genitor e que as suas necessidades sejam supridas frente a possibilidade de cada genitor, portanto, não seria a ação de prestação de contas a via adequada para modificar valores da prestação alimentícia no caso.

Mônica Cecílio Rodrigues é advogada, doutora em processo civil pela PUC-SP e professora universitária

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