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O ex-cônjuge como, ainda, herdeiro testamentário

Mônica Cecílio Rodrigues
Publicado em 07/12/2020 às 08:56Atualizado em 18/12/2022 às 11:14
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Apesar de pouco difundida a confecção do testamento para disposição de patrimônio e ainda para alguns ser um imbróglio, podemos encontrar aqueles que se antecipam e determinam quais serão os beneficiários para o recebimento do patrimônio que irá deixar em razão de sua morte.

A regra brasileira não permite a livre disposição do proprietário do patrimônio quando existirem herdeiros necessários. E como herdeiros necessários a legislação e a jurisprudência nomina os descendentes, os ascendentes, o cônjuge ou companheiro. Assim, caso exista qualquer um dos denominados herdeiros necessários o testador deverá restringir a disposição do patrimônio pelo testamento a cinquenta por cento de sua totalidade.

Este percentual (cinquenta por cento) é chamado de parte disponível podendo ser deixado para aquele que mais aprouver ao testador. O outro percentual é a parte legítima, que caberá aos herdeiros necessários, independentemente se este também for beneficiado pela parte disponível.

Ou seja: o herdeiro necessário tem o seu percentual resguardado na parte legítima e pode ser beneficiado pela parte disponível também.

A questão suscitada é: o testador beneficiou, na parte disponível, o seu cônjuge, quando ainda era casado; sendo que posteriormente ocorreu a dissolução do matrimônio, e aquele que era seu consorte passa a ser ex-cônjuge.

Poderia ele ainda ser beneficiado pelo testamento, haja vista que a qualidade de cônjuge não mais existe, em razão do divórcio?

Devemos tratar formalmente as questões contidas no testamento e levar em conta que a qualquer tempo o testador, a seu bel prazer é livre para poder alterar o testamento. Não existindo proibição para isto, a não ser a exceção de reconhecimento de paternidade.

Pois bem, o beneficiário em questão foi uma pessoa, que coincidentemente era a época do testamento casado com o testador.

O fato de estar casado em nada interfere no benefício estipulado diretamente; haja vista que o testador deixou para a pessoa, não condicionando a permanência do estado de casado para recebimento do benefício.

Antes de ser cônjuge ou ex-cônjuge a disposição é em favor de uma pessoa que passa a ser o herdeiro testamentário, não se vislumbrando a condição, no caso, do falecimento ocorrer no estado de casado.

Assim, resta claro que o testamento é valido e eficaz com relação aos beneficiários. O que se deve notar é que agora, momento que o testamento deve ser cumprido, aquele herdeiro testamentário que à época do testamento era também herdeiro necessário não é mais; assim, tem assegurada a sua participação como herdeiro instituído que é pelo testamento.

As questões práticas, legais e de aferição do percentual que irá receber deve ser calculada levando em conta a totalidade do patrimônio deixado pelo testador.

Com todo respeito e apesar de alguns doutrinadores vislumbrarem a impossibilidade de recebimento do benefício pelo ex-cônjuge, justamente em razão de haver terminado a sociedade conjugal, não comungo com esta opinião.

Não foi condicionante do testamento que o casamento continue para que o herdeiro, que hoje é ex-cônjuge, seja beneficiário.

O testador poderia a qualquer tempo, inclusive após o término do matrimônio, modificar a disposição testamentária. Mas não o fez.

Razão pela qual entende-se que a intenção do testador era mesmo beneficiar aquela pessoa, independentemente da continuidade ou não do casamento com o testante.

Não podemos ser mais realista do que o testador!!

Dra. Mônica Cecílio Rodrigues – advogada, doutora em processo civil pela PUC-SP e professora universitária. https://www.monicaceciliorodrigues.com/

 

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