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A emenda de um soneto mal tocado.

Mônica Cecílio Rodrigues
Publicado em 15/06/2020 às 06:58Atualizado em 18/12/2022 às 07:03
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Sem sombra de dúvidas a época pela qual estamos todos passando não é fácil; por vezes, até mesmo incompreensível. Quer seja pelo confinamento que se torna obrigatório, pela responsabilidade de cada um; quer seja pela preocupação econômica que assola a todos. O futuro é incerto, o presente vai se vivendo e o passado ao menos todos nós temos a consciência do que aconteceu. 

Pois bem, devemos enfrentar o que virá, sem muitas escolhas e com restritas oportunidades para a solução de alguns problemas jurídicos que surgem em razão dos tempos bicudos, tentando chegar a soluções igualitárias para as partes.

É como tentar equilibrar a água na colher correndo para alcançar a chegada!! 

Com certeza algumas consideráveis gotas vão ficar pelo caminho...

E com a novíssima Lei nº. 14.010, de 10 de junho de 2020, o legislador tentou equilibrar a água e a colher da melhor forma que pode e com os recursos legais pré-existentes no ordenamento jurídico, para tentar salvar um pouco de água, quando determinou que até 30 de outubro de 2020, a prisão civil por dívida alimentícia, prevista na legislação processual deverá ser cumprida exclusivamente sob a modalidade domiciliar, sem prejuízo da exigibilidade das respectivas obrigações.

Alguns imbróglios certamente irão surgir e outros tantos oportunismos serão utilizados para este benefício prisional concedido ao devedor da pensão de alimentos.

Pelo que vejamos: as prestações alimentícias devidas até 30 de outubro p. futuro estarão severamente comprometidas de pagamento uma vez que a concessão da prisão domiciliar, não podemos negar, facilita a inadimplência. Acrescendo ao fato de que, o valor devido pode ser um valor acumulado de várias mensalidades atrasadas; e, agora com a oportunidade de cumprir a prisão domiciliar, o devedor restringe a ficar em casa, não podendo ser novamente coibido por este débito pela prisão.

Ou seja: não paga, cumpre a prisão domiciliar e como não tem bens penhoráveis, a dívida está paga.

Uma crítica que se faz é pela redação do texto legal, haja vista que, poderia fazer uma exceção a possibilidade do cumprimento da prisão domiciliar a apenas as prestações alimentícias que se venceram depois de abril p. passado. Simplesmente porque, não podemos permitir a concessão da prisão domiciliar a débito pretéritos e anteriores ao período de quarentena.

Explicando em miúdos: janeiro, fevereiro e março deste ano não deveriam estar incluídos na possibilidade da prisão excepcional; pelo simples fato de que estes meses não estávamos em quarentena e não havia qualquer comprometimento no ganho do devedor e muito menos se cogitava de contaminação em nosso país. Tanto é verdade que as festividades carnavalescas aconteceram e fizeram parte do país, de norte a sul.

Ainda, é conhecido por todos que o processo que trata do recebimento da pensão alimentícia, pelo rito prisional, pode se arrastar por anos a fio, e que se iniciou com o pedido das três últimas prestações inadimplidas. E agora com a concessão excepcional da prisão domiciliar o referido débito “contorcidamente” estará quitado, na ausência de qualquer outra possibilidade de penhora, quer seja de bens ou dinheiro.

Por isto, vale a pena destacar que a novíssima lei que se comenta, no artigo específico da prisão domiciliar deveria conter a exceção de que a prisão domiciliar somente abrangeria as parcelas correspondentes ao período da quarentena, parcelas anteriores a este período o devedor não poderia se beneficiar da prisão domiciliar.

E nem se justifica colocar no mesmo “pacote”, pois débitos anteriores a quarentena devem ser cobrados com a prisão civil outrora estatuída, devolvendo o devedor ao regime legal após o dia 30 de outubro futuro, sob pena de concluirmos a corrida com a colher seca; ou melhor o credor com o estomago vazio!

Como diria Hamlet: “Anjos do céu, correi em nosso auxílio”!!

Dra. Mônica Cecílio Rodrigues – advogada, doutora em processo civil pela PUC-SP e professora universitária.

 

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