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O pacto antenupcial e as restrições do STJ

Mônica Cecílio Rodrigues
Publicado em 03/02/2020 às 06:50Atualizado em 18/12/2022 às 03:58
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Não tenho nenhuma pretensão e muito menos quero acabar com nenhum sonho de que tanto o casamento, como a união estável podem ser um mar de rosas... mas sabemos muito bem que ambos constituem uma sociedade com reflexos econômicos, principalmente, se o regime de bens não for o de separação obrigatória ou total.

Destarte, esta sociedade “econômica”, que deve ser sem fins lucrativos, posto que é regida por um regime de bens; e que caso os nubentes não se enquadrem na exceção legal poderão escolher livremente e a seu bel prazer aqueles dentre os existentes na lei.

E se for casamento deve ser precedido de um pacto antenupcial e se for união estável no próprio contrato ou escritura de constituição o momento de eleição para o regime de bens.

Pois bem, o julgado ora em comento aprecia as disposições contidas no pacto antenupcial, que vai além do regime de bens, mas alcança também os direitos sucessórios que cada cônjuge terá sobre o patrimônio do outro em caso de falecimento.

A nosso entender, o pacto antenupcial, de acordo com a permissão legal deve dispor quanto ao patrimônio do casal para durante e para depois do casamento, em caso de separação, divórcio; não podendo ultrapassar esta pactuação para além deste termo ou tempo, podendo refletir sobre os direitos sucessórios; e muito menos contrariar normas de ordem pública que dizem respeito quanto aos bens, quanto as pessoas, quanto a incomunicabilidade e também quanto a comunicabilidade.

Existe proibição legal de que não pode ser objeto de contrato herança de pessoa viva, o que impediria qualquer dos cônjuges de contratar ou celebrar sobre o patrimônio do outro sob a expectativa de herdar; mas, e quanto a abrir mão do direito de receber os referidos bens em caso de falecimento do outro cônjuge, denominada pela lei de renúncia ao direito de herdar.

Seria possível pactuar antecipadamente a renúncia? Até mesmo antes do falecimento do autor da herança?

A lei não proíbe a renúncia, que é ato unilateral; e portanto, independe de aceitação de outrem; MAS, no caso em tela, não aconteceu a renúncia e sim uma modificação das cláusulas contratuais do regime de bens no pacto antenupcial, e que são de ordem pública.

E de acordo com a lei qualquer convenção ou cláusula que contravenha disposição absoluta de lei é nula, não restando outra alternativa ao julgador do que anular aquela pactuada que contrariou a cláusula legal que retirou do cônjuge sobrevivente o direito de herdar os bens do cônjuge falecido.

A mais nova doutrina civil tem aceitado a possibilidade de renúncia aos direitos sucessórios mesmo que seja feito previamente em pacto antenupcial; mas aqui foi feita uma alteração nas regras de sucessão no pacto conjugal, com relação a ordem sucessória, com total inversão da determinação legal. O que sem sombra de dúvida caracteriza um desrespeito as normas legais do regime pactuado entre os cônjuges e as determinações do direito sucessório, e que no caso foi o de separação total de bens.

No regime de separação convencional de bens, em caso de falecimento de um dos cônjuges, e o falecido não tenha filhos e nem ascendentes, o cônjuge sobrevivente herdará a totalidade dos bens; se porventura houver descendentes este herdará a totalidade dos bens, excluindo o cônjuge; de outra feita se houver um ascendente, o cônjuge herdará a metade e a outra irá para o ascendente; se dois ascendentes, cada um herdará um terço e o outro terço irá para o cônjuge supérstite.

A força cogente do regime de bens se exerce durante o casamento e opera o direito sucessório que não pode ser contrariado com pactuação diversa da legal mesmo que seja pelos nubentes.

Poderiam ter renunciado... por ser direito unilateral e exercitável. Faltou um pouco de “astúcia” jurídica...

Mônica Cecílio Rodrigues é advogada, doutora em processo civil e professora universitária.

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