Morreu.
Não se sabe por quê, como, de onde ele veio, o que ele fez.
O que ele fez?
Ele viveu. Viveu como cada um de nós.
Não viveu preso a uma cela. Viveu preso a um mundo, a um sistema.
Resolvendo os problemas de toda a humanidade, e emaranhado em sua própria sorte.
É fácil, se fulano está sem dinheiro é só pedir emprestado, se o outro está doente deve consultar um médico.
E ele?
Os outros sabem o que ele busca. Ele não.
Só vê a vida passar naquele corre-corre diário sem sentido e sensatez.
Levanta cedo, toma café, lê seu jornal e fuma o cigarro que cada dia mais se torna indispensável.
Vai trabalhar numa rotina rotineira onde tudo o que acontece está marcado no papel, fixado na parede, previsto no esquema.
À tarde, um banho e planos.
Planos de quê? O que ele quer?
Tá complicado? Mudar como?
Ele faz parte da máquina que gira, se engrena e se destrói diante de seus próprios olhos.
Quer saber, quer aprender, lê livros e jornais, assiste TV, vai ao cinema, discute com amigos, se mata.
Para. O que ele sabe dele?
Ele vive.
Suporta a dor, o cansaço, ri, fica vermelho quando recebe um elogio, sofre, chora, canta, dança, abraça, odeia, ama...
Ele faz tudo isso.
Ou melhor, fazia. Está morto.
E daí?
Obs.: Escrevi isso em 1978. Qualquer semelhança com a realidade atual pode ser mera coincidência.