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E daí?

Márcia Moreno Campos
Publicado em 02/05/2020 às 10:40Atualizado em 18/12/2022 às 06:02
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Morreu. 

Não se sabe por quê, como, de onde ele veio, o que ele fez.

O que ele fez?

Ele viveu. Viveu como cada um de nós.

Não viveu preso a uma cela. Viveu preso a um mundo, a um sistema.

Resolvendo os problemas de toda a humanidade, e emaranhado em sua própria sorte.

É fácil, se fulano está sem dinheiro é só pedir emprestado, se o outro está doente deve consultar um médico.

E ele?

Os outros sabem o que ele busca. Ele não.

Só vê a vida passar naquele corre-corre diário sem sentido e sensatez.

Levanta cedo, toma café, lê seu jornal e fuma o cigarro que cada dia mais se torna indispensável.

Vai trabalhar numa rotina rotineira onde tudo o que acontece está marcado no papel, fixado na parede, previsto no esquema.

À tarde, um banho e planos.

Planos de quê? O que ele quer?

Tá complicado? Mudar como?

Ele faz parte da máquina que gira, se engrena e se destrói diante de seus próprios olhos.

Quer saber, quer aprender, lê livros e jornais, assiste TV, vai ao cinema, discute com amigos, se mata.

Para. O que ele sabe dele?

Ele vive.

Suporta a dor, o cansaço, ri, fica vermelho quando recebe um elogio, sofre, chora, canta, dança, abraça, odeia, ama...

Ele faz tudo isso.

Ou melhor, fazia. Está morto.

E daí?

Obs.: Escrevi isso em 1978. Qualquer semelhança com a realidade atual pode ser mera coincidência.

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