A previsão de perdão judicial como benefício aos irmãos Batista nos acordos de colaboração premiada que firmaram com a Procuradoria-Geral da República vem gerando polêmica.
Releva lembrar que a colaboração premiada constitui meio de prova excepcional. É fundamental para a quebra da lei de silêncio que permeia delitos que organizações criminosas de alto escalão político e empresarial praticam geralmente entre quatro paredes. A contrapartida pelas informações e provas é o benefício do colaborador, que, obviamente, busca as autoridades com o objetivo de obtê-lo.
O que pauta a seleção do benefício penal, que pode consistir na redução da pena em até dois terços ou no perdão judicial, é a relevância dos fatos trazidos pelo colaborador.
No caso dos empresários do Grupo J&F, a relevância é manifesta. Eles narraram crimes envolvendo 1.829 candidatos a cargos eletivos, de 28 partidos políticos. Relataram, inclusive, crimes em andamento, o que possibilitou ações controladas que acompanharam a prática de delitos e propiciaram identificar o caminho de dinheiro de propinas. Comprometeram-se a pagar multas individuais em montantes sem precedentes.
Os fatos noticiados por tais colaboradores foram examinados cuidadosamente, assim como as provas indicadas para corroboração.
O tratamento dado aos empresários não foi brando. Ora, trata-se de esquemas criminosos envolvendo pessoas que exercem enormes parcelas do alto poder governamental e vultosas somas de dinheiro. Os colaboradores colocaram suas próprias integridades em risco ao informar delitos em curso.
Conforme previsto na lei, os colaboradores renunciaram ao direito ao silêncio e se comprometeram a dizer a verdade, sob pena de perderem o benefício. Além disso, acaso o acordo não fosse firmado, as informações até ali colhidas não poderiam ser utilizadas no interesse das investigações.
Por isso, a Procuradoria-Geral da República, acertadamente, previu nos acordos o perdão judicial: o interesse público o justificou.
Ainda há entre nós certa incompreensão da colaboração premiada, notadamente quanto à concessão de benefícios a um criminoso confesso. Tal provavelmente decorre da nossa falta de vivência com tal instituto de Justiça criminal negociada, que só veio a ser adequadamente disciplinado com a chamada lei das organizações criminosas (Lei nº 12.850/2013) e a ser utilizado em maior escala a partir daí.
No rumoroso caso, a proporcionalidade entre os benefícios concedidos aos colaboradores e a importância do acordo para a persecução penal de crimes graves há de ser reconhecida. O tempo tem sido o senhor da razão no que se refere à Lava Jato.
(*) Procurador da República em Uberaba