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O leite derramado

Certa feita ouvi uma pregação no sentido de que quando o Mestre usou da expressão derrubem esse templo

Ricardo Cavalcante Motta
Publicado em 24/01/2020 às 19:00Atualizado em 18/12/2022 às 03:44
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Certa feita ouvi uma pregação no sentido de que quando o Mestre usou da expressão "derrubem esse templo que eu o reconstruirei em três dias", estava referindo-se ao próprio corpo, que veio ressuscitar em três dias, e não propriamente ao templo edificado diante do qual o fato se deu. Fazia alusão ao seu corpo como o templo sagrado que abrigava sua alma. A relação do ser humano com a matéria é intrínseca, de suma relevância durante um ciclo, ao ponto de ser evidente a importância da matéria para o homem no estágio de sua existência. Merece o valor adequado. Assim, enquanto seres terrestres, é essencial que cuidemos do nosso corpo com a atenção e o respeito de quem está cuidando do abrigo da própria alma, embora há quem que hoje ande cuidando quase que exclusivamente da aparência estética, até mais que da saúde, relegando a existência espiritual. Afinal, consta que Cristo, embora tenha realçado a relevância física como de um templo sagrado, não cuidou de deixar um corpo material para ser adorado. Houve o tempo da separação em que sua alma sublimou. Há a hora em que o espírito se eleva e deixa o corpo que volta a fazer parte do todo da matéria. Tudo tem sua nobre função na ocasião adequada. É sagrado o feijão, o arroz. A linda maçã que alimenta, depois voltará a ser simples matéria orgânica com sua importância, mas, como fruto, se perecerá. Por isso o Mestre deixou claro ao nos lembrar que somos pó e que ao pó retornaremos. Não para desprezar a matéria em absoluto, mas para ensinar a dela nos desprender quando for o caso. Deixar para trás prejuízos e olhar para frente porque aquele ciclo se foi. Não permitir que lembranças de perdas materiais sejam âncoras para prosseguir, constituindo-se rancores contra a sorte, realçando prestígio maior ao infortúnio que a capacidade resguardada de recomeçar, de reconstruir, de reerguer. Atrelar-se às perdas materiais do passado não permite elevação, desenvolvimento, crescimento, evolução que, enfim, é a proposta da lei universal. Parece simples, claro, mas na prática não é. Ao contrário, é muito difícil lidar com perdas de toda ordem. Contudo, tome consciência, tente, não se lamente além da decepção imediata pelo que foi perdido. Não se apegue a coisas que somente representam o pranto. Isto faz mal, adoece. Reinvente-se, renasça. Não chore o leite derramado.

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