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Esperança

Ana Salvador
Publicado em 14/12/2020 às 18:27Atualizado em 18/12/2022 às 11:29
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Um conjunto simpático de edifícios, não muito altos, todos iguais, bem feitos, todos de tijolinho à vista, com janelas muito uniformes. As ruas são desafogadas e pode-se imaginar crianças brincando por ali, pessoas indo ao trabalho ou voltando dele ou de tarefas diárias, fazendo alguma coisa mundana, às vezes distraídas, como tantas vezes fazemos. Foi nesse momento que tive um pequeno vislumbre do horror que se abateu sobre a humanidade, já que estávamos visitando o campo de concentração de Auschwitz.

No portão de entrada, já havíamos sido recebidos pela insultuosa e infame saudação Arbeit Mach Frei (O Trabalho Liberta). O lugar é de contemplação e respeito; entra-se sabendo a imensidão de sofrimento e horror que ocorreu dentro daqueles muros. A expectativa era ver algo que se assemelhasse a uma prisão; não, um condomínio. Essa pequena e breve peça que meu cérebro me pregou tornou a visita ainda mais chocante. Aquelas eram pessoas que, não muito tempo antes, estavam em suas casas, seus trabalhos, vivendo suas vidas ao mesmo tempo banais e únicas quanto qualquer outra. Porém terminaram naquele campo, olhando o mal absoluto, a um respiro de distância. Um evento tão extraordinário que leva multidões, todos os anos, a uma visita turística extremamente desconfortável, angustiante e imprescindível.

A impressão de normalidade logo se desfez quando começamos a entrar nos prédios. No grupo em que eu estava, relataram impressões diferentes. Para mim, ver o “paredão” onde executavam prisioneiros trouxe à memória relatos, até então, distantes. Não mais. Pensei que, por aquelas ruas, passou Maximiliano Maria Kolbe, cuja história li antes de ser capaz de compreender a magnitude do seu sacrifício. Uma colega passou mal quando viu a “montanha” de cabelos, restos de prisioneiros reciclados no esforço de guerra. A mim, os óculos impactaram mais.

Como tantos outros museus, Auschwitz está fechado para visitas presenciais, mas virtualmente é possível lá ir. Para aprender e curar. No fim, o melhor da humanidade foi capaz de vencer o abismo de horror que, por um breve momento, ainda que interminável para os cativos, lá se instalou. É uma mensagem de esperança, só para adultos, é verdade, mas, se calhar, é do que precisamos hoje.

Ana Maria Leal Salvador Vilanova

Engenheira civil, cinéfila, ailurófila e adepta da caminhada nórdica. [email protected]

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