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Despedindo quem merece

Ana Maria Leal Salvador Vilanova
Publicado em 18/04/2022 às 18:55Atualizado em 18/12/2022 às 19:17
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Muita gente mudou de vida durante e por causa da pandemia. Por reflexão ou necessidade, projetos foram abandonados, recuperados ou iniciados. Entre os muitos casos, está o de certa confeiteira no Nordeste. Saindo de um emprego em uma multinacional, passou a fazer bolos em casa para os amigos. As encomendas cresceram e, em pouco tempo, já era um negócio.

Nestes tempos em que nada existe sem presença virtual, é possível acompanhar o dia a dia na nova empresa por suas postagens em redes sociais. Foi assim que soubemos do caso da cliente sem noção.

É normal pedir orçamentos em mais de um lugar, de forma a comparar opções para tomar uma decisão. A ética diz que, se houver uma possibilidade real de que o cliente compre o que o vendedor oferece, tudo bem. Não é o caso de levar a mal não fechar negócio em todas as consultas feitas, é do jogo. Vamos aprendendo.

Mas há formas e formas. Pedir montanhas de detalhes a horas impossíveis e prazos irrealizáveis já não é razoável. E, o pior: quando vem a comunicação de que a proposta não foi aceita, inclui um pedido de cair o queixo. A cliente pediu a receita do recheio mais cobiçado, o segredo, coração e alma do bolo mais famoso, para passar para a outra confeiteira.

Pedido educadamente recusado, vida que segue. Ou não?

Dois dias antes do evento, a cliente escreve novamente dizendo que, afinal, queria adjudicar o trabalho à nossa heroína. E ainda tentou massagear o ego da profissional; talvez um resquício de civilidade tenha acendido uma luzinha qualquer no fundo do cérebro da senhora. Disse que o marido só gostava daquele bolo e que a festa do filho tinha que ser perfeita.

Proposta declinada, impossível de atender nas condições impostas, veio a enxurrada de veneno vomitada teclado abaixo, que máscaras não costumam resistir muito tempo. Disse que trabalho era trabalho, que a confeiteira era pouco profissional por não aceitar e que ia perder clientes, decerto tão maravilhosos quanto ela própria. Onde já se viu isso?

Ficou a lição que profissionais autônomos aprendem a custo. Quando, como e por que despedir certos clientes. Sim, clientes também são despedidos. Ao menos deveriam, de vez em quando, a bem da saúde mental do profissional que está fazendo sua vida. Fala-se pouco disto nas organizações, mas os riscos psicossociais são parte da segurança no trabalho, tanto quanto os riscos físicos.

Ana Maria Leal Salvador Vilanova

Engenheira civil, cinéfila, ailurófila e adepta da caminhada nórdica

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