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O financiamento público de campanha e o paradoxo com o atual contexto socioeconômico e ético-moral brasileiro

A grande novidade das eleições municipais desse ano será o financiamento público de campanha

Carlos Magno Bracarense
Publicado em 01/02/2020 às 09:03Atualizado em 18/12/2022 às 03:56
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A grande novidade das eleições municipais desse ano será o financiamento público de campanha. Não que ele não existisse... o fundo partidário (há muito existente – que não se confunde com o atual – se destina ao funcionamento dos partidos políticos), o custeio da propaganda eleitoral gratuita e a renúncia fiscal concedida aos partidos políticos sobre seus patrimônios, rendas e serviços já figuravam como formas de financiamento público. 

Criado em meio à proibição, pelo Supremo Tribunal Federal, das doações de campanha por parte de pessoas jurídicas, o FEFC (Fundo Especial de Financiamento de Campanha) despontará como o grande financiador das campanhas pelas disputas aos governos das prefeituras e câmaras municipais pelo Brasil afora.

Será a primeira vez que as eleições para prefeito e vereadores serão custeadas, em sua maioria, por dinheiro público pela via legal.

Em todo mundo, são basicamente três as modalidades de financiamento de campanha: o financiamento público exclusivo, o financiamento privado e o financiamento misto.

Com a criação do FEFC o Brasil passa a acompanhar países que utilizam o financiamento misto, como os Estados Unidos, Canadá, Argentina, Chile, França, Portugal e Reino Unido, que já se valiam do financiamento público para campanhas eleitorais.

Com o meio político assolado em escândalos (mensalão, petrolão, laranjal...), o recorrente uso do caixa 2 e a sistemática aprovação de candidatos ficha-suja, o financiamento público irá contrastar com a crise econômica ainda em evidência, e o que é pior, com o grave quadro de crise ético-moral que se abate sob a maioria dos partidos políticos brasileiros e seus dirigentes, estando vários deles presos, das mais diferentes agremiações.

Some-se a isso, ainda, a divulgação feita na última semana pela ONG Transparência Internacional trazendo o ranking do Índice de Percepção da Corrupção (IPC) com o Brasil na lastimável 106ª posição, com apenas 35 pontos numa escala de 0 a 100, figurando atrás de países como o Sri Lanka, Timor Leste, Gâmbia e a vizinha Colômbia. Muito dessa nota e da posição do País se devem à promiscuidade nas relações entre o setor público com os grandes conglomerados econômicos, vide caso Odebrecht.

Num país com mais de 12 milhões de desempregados; índices alarmantes de violência urbana, com polícias sucateadas e desmotivadas; um sistema de saúde precário, onde pacientes ainda frequentam os corredores de hospitais públicos à espera de leitos ou morrem por falta de medicamentos, exames e tratamento adequado; professores que ganham baixos salários e convivem com a violência em sala de aula; cidades com infraestrutura precária; malha asfáltica obsoleta e esburacada nas estradas e nas cidades; municípios e Estados com as receitas depauperadas; a população amargará com a retirada de mais de 3 bilhões de reais do orçamento da União para custear as campanhas eleitorais. Tudo isso em nome de uma cara, mas muito cara, democracia.

Nesse contexto, é de se esperar um rigoroso controle do financiamento público pelos órgãos competentes, mediante robusta fiscalização e observação da legislação eleitoral, bem como o fortalecimento da integridade eleitoral, com a implantação de regras de compliance pelos partidos políticos e seus dirigentes, inclusive os submetendo às leis de improbidade administrativa. Outra medida salutar é o lançamento de candidaturas fichas limpas, de cidadãos íntegros e probos, com projetos de Estado, focados exclusivamente no interesse público, em detrimento aos projetos de poder, focados nos interesses escusos e pessoais.

Mais do que nunca, será preciso que o cidadão/eleitor exerça seu papel de protagonista, no controle social para acompanhamento da utilização dos recursos públicos e utilize com sabedoria a única ferramenta eficaz contra todas as mazelas: o voto livre e consciente.

Afinal, como diria o saudoso Ary Barros “É pra frente que se anda...”. 

(*) Pós-graduando em Gestão Pública Municipal pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU); atual controlador-geral do município de Uberaba e advogado

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