ARTICULISTAS

O peso das pequenas bolsas

José Elias de Rezende Júnior
Publicado em 12/09/2020 às 00:43Atualizado em 18/12/2022 às 09:27
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Na obra mediúnica da lavra de Chico Xavier, assinada pelo espírito de Humberto de Campos, intitulada “Boa Nova”, dentre as trinta belíssimas histórias sobre alguns atos da vida do Cristo, há um interessante capítulo que trata da escolha dos apóstolos e das características do grupo recém-formado.

Narra o autor que ao final de sua primeira alocução junto aos discípulos, no qual o Cristo os alertara acerca dos sacrifícios do porvir, Judas Iscariotes foi o que primeiro ofereceu alvitre à edificação daquele reino, sugerindo que fossem arrecadadas contribuições para a obra, sob o argumento da imprescindibilidade do dinheiro. E, após autorizado, com ressalvas sobre a tentação das posses, tendo arrecadado algumas migalhas junto à pequena assembleia, ofereceu a pequena bolsa ao Mestre que redarguiu em tom profétic “Sim, Judas, a bolsa é pequenina; contudo, permita Deus que nunca sucumbas ao seu peso!”.

Pois bem, no Brasil de 2020, a crise econômica e social decorrente da pandemia de coronavírus levou à instituição do necessário auxílio emergencial, inicialmente com o pagamento de três parcelas mensais e prorrogado por mais dois meses. E, por meio de recém-editada Medida Provisória, o Governo Federal prorrogou o benefício até o final do ano, com valor mensal reduzido. 

Com o início do pagamento do benefício, coincidência ou não, as pesquisas passaram a indicar um aumento da popularidade do Presidente da República, especialmente em redutos onde até então experimentava certa rejeição, fato que gerou duas claras contradições  na política: 1) o mandatário máximo da nação, ao que parece seduzido pela possibilidade de reeleição, decidiu abrandar o tom neoliberal apregoado durante a campanha eleitoral e formalizado em sua proposta de governo, para adotar uma agenda, diga-se, mais social, gerando conflitos e baixas em sua equipe econômica; 2) os políticos tradicionalmente simpatizantes das políticas sociais, igualmente preocupados com a corrida eleitoral, passaram a acusar o presidente de fazer exatamente o que fizeram por anos, enquanto estiveram no poder, ou seja, de utilizar tais políticas como forma de cooptação de eleitores.

No âmbito da sociedade brasileira, esta recebeu com revolta, descontentamento e certa dose de hipocrisia, as denúncias de que pessoas abastadas estavam recebendo indevidamente o benefício, enquanto outros, de fato necessitados, aguardavam a liberação dos valores.

E, diante destes efeitos políticos, sociais e morais causados pela pequena “bolsa” emergencial, o ensinamento do Cristo exsurge em toda sua plenitude e atualidade, a demonstrar que, caso o Mestre retornasse à romagem terrestre em carne em osso, como muitos desejam e aguardam, certamente não faltariam novos “Judas” prontos a contribuírem para que novamente o seu destino final fosse a cruz do sacrifício, o que indica ainda que, passados mais de dois mil anos, a redenção da humanidade não prescinde do sofrimento para a sua realização.

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