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Home office em tempos de Covid-19

José Elias de Rezende Júnior
Publicado em 20/05/2020 às 07:16Atualizado em 18/12/2022 às 06:27
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Desde a decretação do estado de calamidade pública decorrente da pandemia mundial de Covid-19 e do implemento das medidas de isolamento social determinadas por Estados e Municípios, muito se tem falado acerca do termo home office.

E, neste contexto, muitos empregados e empregadores possuem legítimas dúvidas acerca de diversas questões ligadas ao referido instituto, principalmente no que tange aos limites ao poder diretivo do empregador nesta modalidade de prestação de serviços, à questão da privacidade dos empregados e dos principais direitos e deveres pertinentes.

É preciso que se esclareça, num primeiro momento, que a terminologia juridicamente correta do instituto é teletrabalho, o qual já estava previsto na CLT, em seus artigos 75-A e seguintes, incluídos no diploma pela reforma trabalhista de 2017.

Nos termos da CLT, considera-se teletrabalho a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo.

Com o advento da Medida Provisória nº 927, de 22/03/2020, a qual teve como objeto a introdução de medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública decorrente da Covid-19, o teletrabalho foi tratado em seus artigos 4º e 5º.

A diferença entre o instituto já existente na CLT e aquele criado especificamente para o período de calamidade pública, é que, neste último caso, a medida pode ser implementada unilateralmente pelo empregador, sem a necessidade de anuência do empregado.

No que se refere aos direitos e deveres das partes nesta modalidade de prestação de serviços, uma das principais questões a serem esclarecidas é referente à duração do trabalho.

Nos termos do que já era previsto na CLT, os empregados em regime de teletrabalho, via de regra, não estão inclusos nos limites de duração da jornada de trabalho e, consequentemente, não fariam jus ao recebimento de horas extras.

A razão de ser da exclusão dos trabalhadores em teletrabalho do regime da duração normal do contrato de trabalho, parte do pressuposto de que não é possível que se faça o controle da jornada de trabalho do empregado nestas condições.

O dispositivo é passível de questionamento, haja vista que, em plena era da tecnologia, é cediço que é possível o controle de jornada de trabalhadores por meio eletrônico, à distância.

Neste contexto, entendo que o ideal é que o trabalhador em regime de teletrabalho não seja submetido, pelo empregador, a rígido controle de jornada, sob pena de ficar caracterizado eventual trabalho extraordinário, quando exceda ao limite de oito horas diárias e 40 horas semanais.

A adoção do teletrabalho não significa, absolutamente, que o empregador perde o seu poder diretivo sobre os empregados, de modo que pode e deve cobrar o cumprimento das atribuições decorrentes do contrato de trabalho, o que não implica, necessariamente, em controle rígido de jornada, sendo que o ideal, no que tange à produtividade, seja o estabelecimento de metas por tarefas a serem realizadas.

Nada impede, outrossim, que os empregados em regime de teletrabalho sejam convocados a participarem de reuniões por meio de aplicativos, sendo que, o empregado que não comparecer, poderá ser penalizado pelo empregador.

No que tange à privacidade do empregado, é óbvio que o teletrabalho não representa, por si só, qualquer mitigação deste direito constitucional de qualquer cidadão. De modo que caberá ao empregador respeitar a honra e a privacidade do empregado, o seu direito ao lazer e à vida familiar, entre outros, bem como o sigilo de suas comunicações e vida privada.

Entretanto, é preciso destacar que há vários precedentes judiciais que entendem que não configura ofensa à privacidade do empregado o monitoramento de suas comunicações, quando realizadas por meio de e-mail ou aplicativos corporativos.

Neste sentido, os empregados em regime de teletrabalho devem tratar de assuntos estritamente profissionais nas ferramentas disponibilizadas pelo empregador para o teletrabalho, sob pena de não poderem alegar ofensa à sua privacidade, quando tratarem de questões pessoais nestes veículos que venham a ser conhecidas por terceiros.

Ademais, o empregado deverá cuidar de sua imagem e de seus familiares quando estiver utilizando ferramentas de videoconferência a serem utilizadas no teletrabalho, sob pena de igualmente não poder reclamar qualquer prejuízo quanto à divulgação de imagens impróprias ou ofensivas à sua honra, sem prejuízo de poder ser ainda punido pelo empregador.

Não são incomuns relatos de empregados que se apresentaram em videoconferências com vestimenta inadequada e até de pijamas, o que certamente é passível de punição.

O assunto é amplo para ser esgotado por meio da presente via, posto que tudo que é novo possui um certo grau de insegurança e incerteza, e não será surpresa se, após o final do isolamento social, observar-se uma grande quantidade de ações trabalhistas para solucionar litígios decorrentes do teletrabalho e de outras situações surgidas durante a pandemia.

E, sendo assim, o ideal é que todos estejam precavidos acerca de seus direitos e deveres e, em caso de dúvida, consultem um profissional.

José Elias de Rezende Júnior

Advogado e professor universitário

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