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Cheirinho de alecrim

Com a mão, Camões deu luz a Lusíadas. Escreveu com penas e tinta à luz de lampião em arandela de vela

Luiz Cláudio dos Reis Campos
Publicado em 21/10/2019 às 19:29Atualizado em 18/12/2022 às 01:13
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Com a mão, Camões deu luz a Lusíadas. Escreveu com penas e tinta à luz de lampião em arandela de vela. Falou de reis e vassalos. Séculos se sobrepuseram na linha infinita do tempo. Camões resiste e existe com sua obra. Perpetua o idioma com a mão artesã de quem esculpe versos. Hoje ele é prêmio pelo que nos premiou. Com sua mão, Camões deu caminho a palavras e rimas na estrada que criou para viajar em mares nunca de antes navegados. Camões é plural de que? É plural literário da máxima expressão da língua lusitana. Destarte farei de cá minha parte e o repetirei: “Cantando espalharei por toda parte/Se a tanto me ajudar engenho e arte”. E assim se assina Camões quem merece sua letra. Soletra sílaba por sílaba: o Tejo numa pororoca desaguou no velho Chico. Este ano, premiou-se um brasileiro com a maior distinção da literatura portuguesa que é o prêmio Camões. Chico Buarque foi escolhido pelo conjunto de sua obra que engloba música, teatro, literatura com pendores culturais de inquestionável talento em todas as áreas. Mais de meio século criando maravilhas com o nosso idioma. Uma vida dedicada à construção literária, irretocável. Sua obra é fonte que não se esgota. Como um olho d’água que brota à superfície, alarga-se em rio que transborda e alcança a imensidão do mar. Este é o velho Chico, intransponível, eterno, de unidade nacional. Permite-se navegável por um bom tempo. Indecifrável, mesmo de posse das melhores cartas náuticas. “Hoje o inimigo veio, veio me espreitar. Armou tocaia lá na curva do rio. Trouxe um porrete, um porrete a "mode" me quebrar, mas eu não quebro não, porque sou macio, viu?!” Trecho da música “Querido Diário” apropriado para o momento. A democracia não pode estar a serviço de sua própria destruição, do triunfo do equívoco, da consagração do personalismo voluntarioso, da banalização e do escracho que vulgariza a arte e enaltece a mediocridade. A arte não se destaca por opções e preferências, mas sim pela capacidade de ser reconhecida, respeitada e admirada, independente de quem a crie. Chico Buarque eternizou-se em suas criações e será louvado tempo afora. É atemporal, imprescritível. “Amálias” que vêm para o bem. Como o destino é fado, “um cheirinho à alecrim, um cacho de uvas doiradas, duas rosas num jardim”.

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