POLÍTICA

Secretário de saúde diz comprovar em defesa que não praticou crime

Lídia Prata
Publicado em 13/09/2021 às 16:12Atualizado em 19/12/2022 às 01:58
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Secretário de Saúde, Sétimo Bóscolo afirma que “julgado” sumariamente pelo Relatório da CEI e pela opinião pública sem aguardar a defesa

Sétimo Bóscolo Neto não titubeou ao ser convidado pela prefeita Elisa para assumir o comando da Saúde em Uberaba. Com passagem bem sucedida pela presidência da Unimed e 40 anos dedicados à Medicina, ele assumiu o cargo no 1º dia de vacinação, quando o planejamento inicial da imunização já estava em andamento, e os números da pandemia, em crescimento acelerado. Nesse meio tempo surgiram denúncias de irregularidades no processo de vacinação, que resultaram na formação da Comissão Especial de Investigação dos “Fura-Filas” e, agora, na Comissão Processante. Na terça-feira, dia 14, o secretário vai depor na CPP. Antes, porém, ele concordou em responder aos questionamentos do Jornal da Manhã sobre o assunto. A entrevista você vai ler a seguir.

JORNAL DA MANHÃ – O senhor está sendo investigado pela Comissão Parlamentar Processante da Câmara Municipal em razão do chamado “escândalo dos fura-filas” na vacinação contra o Covid. Uma das acusações que pesam contra o senhor é de que haveria omissão de sua parte, pois não teria tomado providências quando teve conhecimento das denúncias na época. Como vê esta acusação?

SÉTIMO BÓSCOLO NETO – A acusação é injusta, e isso foi totalmente demonstrado tanto na defesa escrita que apresentei, quanto pelos depoimentos colhidos, no âmbito da Comissão Processante. Não pratiquei qualquer ação ou omissão que implicasse em crime ou infração político-administrativa e isso foi devidamente comprovado. Na CEI não tive oportunidade de apresentar contraditório nem defesa, em razão da natureza investigativa do procedimento. Fui “julgado” sumariamente pelo Relatório e pela opinião pública que nele acreditou, sem aguardar a defesa, isto é, sem me dar a chance de apresentar as contraprovas às acusações finais. Agora na Processante, conforme previsto no rito descrito no Regimento Interno da Câmara, estou tendo a oportunidade de comprovar que não agi nem me omiti em prática de infração político-administrativa. Os procedimentos tomados durante o início da campanha de vacinação, alvo do processo, seguiram rigorosamente o que previa o Plano Nacional de Imunização de 16/12/2020, o Informe Técnico do Ministério da Saúde de 19/01/2021, o Plano Municipal de Contingência elaborado antes da minha chegada à Secretaria, e as demais normas técnicas daquele período inicial de vacinação. Não devemos esquecer que naqueles dias iniciais da vacinação, as normativas eram amplas e genéricas, as quais depois foram se aperfeiçoando no decorrer do processo de vacinação, gerando situações de insegurança e incertezas, no processo de operacionalização da vacinação, que ficou a cargo do Município, por expressa disposição das normas superiores. Alie isso ao clima de desespero pela vacinação que tomou conta do país em razão do episódio de Manaus e da sua variante. Realmente foi um período muito conturbado, durante o qual tivemos que “trocar o pneu com o carro em movimento”, e justamente por isso, havia uma Comissão, encabeçada pela Secretária Adjunta, a qual foi incumbida de, junto com as demais pessoas que ali participavam, a deliberar de forma colegiada sobre o caminhar da campanha de vacinação. Acredito e rogo que os Srs. Vereadores, tendo acesso à defesa e às provas que ali juntei, juntamente com a análise dos depoimentos tomados, sob compromisso, contraditório e ampla defesa, na Processante, assim também concluirão.

JM - O senhor tomou alguma medida quando as denúncias de fura-filas chegaram aos seus ouvidos?

SÉTIMO – Em primeiro lugar, o número aproximado de 3.100 doses que teriam sido aplicadas indevidamente, apresentado pela CEI, não se revela crível, com todo respeito ao trabalho realizado. Conforme comprovo minuciosamente na defesa, as duas primeiras remessas de vacinas que chegaram a Uberaba, objeto da CEI, descartando as doses reservadas para a aplicação da 2ª dose, representaram aproximadamente de 10.000 doses, entre 20/01/2021 e 01/02/2021. Então, segundo a CEI, teria ocorrido aproximadamente 1/4 de fura-filas na vacinação nestas duas primeiras remessas, o que já nos induz inicialmente a concluir pela inconsistência deste número, o qual restou completamente afastado na defesa e documentação produzida na Processante. Sobre as irregularidades noticiadas, a atribuição institucional e legal para a apuração destas e a respectiva aplicação de penalidades desta natureza, no âmbito de processo administrativo, pertence à Controladoria Geral do Município. A mim, como gestor público da pasta da Saúde, compete determinar a apuração de irregularidade como “ato de ofício”, quando tomo conhecimento, além de agir sempre no sentido de que quem pratica qualquer irregularidade deva responder pessoalmente por seus atos, seja no âmbito público ou particular, em regular processo administrativo. E isso foi feito. Nesse sentido, comprovei documentalmente na defesa que apresentei que determinei, por escrito, na época dos fatos, a abertura de procedimentos de sindicância e apuração de irregularidades que chegaram ao meu conhecimento, inclusive o procedimento de sindicância visando a apuração da vacinação indevida de 170 pessoas aproximadamente, com 65 anos ou mais, ocorrido do dia 29/03/2021, o qual foi deflagrado por minha expressa determinação. Além deste procedimento, na defesa apresentada, comprovei os outros procedimentos de apuração também deflagrados e em andamento na Controladoria, visando apurar denúncias de irregularidades, e garantir a lisura e a correção da vacinação, todos estes procedimentos mencionados minuciosamente na defesa e franqueados aos Srs. Vereadores para análise, por ofício emitido pela Controladoria. A Controladoria ainda fez comunicações sob a forma de Notícias de Fato ao Ministério Público, todas comprovadas na defesa, pois em relação às pessoas que não são servidores públicos, é o que lhe cumpre fazer, já que não cabe à Prefeitura., por lei, processar administrativamente quem não seja servidor público. A par destes procedimentos de apuração, destaquei na defesa as atas de reunião da Comissão de Vacinação constituída para operacionalizar a campanha de vacinação, que, além dos depoimentos tomados pelas testemunhas, confirmam que eu, por diversas vezes, manifestei solicitando providências no sentido de apuração de toda e qualquer irregularidade com a responsabilização dos culpados, conforme determina a lei, em regular processo administrativo, e que a campanha de vacinação deveria seguir estritamente as diretrizes normativas do Plano Nacional de Imunização e das normas técnicas do Ministério da Saúde, também no âmbito Estadual e Municipal.

JM – Sobre esta vacinação do dia 29/03/2021, quando foram vacinadas indevidamente pessoas acima de 65 anos, quem assinou esse requerimento pedindo a abertura de investigação pela Controladoria foi o senhor? Quando se deu esse ofício? O senhor levou esse fato ao conhecimento da prefeita antes?

SÉTIMO – Conforme lhe disse, esse procedimento foi aberto por minha expressa determinação, de 31 de março de 2021, em ofício/memorando endereçado à Controladoria, gerando o processo de Sindicância Administrativa Investigativa, procedimento este que foi decisivo, por exemplo, para que os Srs. Vereadores concluíssem que a Prefeita não praticou omissão em ato de infração político-administrativa, quando da votação final do Relatório da CEI. A cópia integral deste Procedimento de Sindicância foi juntada via CD-ROM na minha defesa, além das cópias em papel das páginas iniciais, tais como a instauração por minha determinação e a abertura do procedimento na sequência, por despacho da Controladoria, e ainda cópia do Relatório conclusivo. Tanto eu quanto a Prefeita, assim que ficamos sabendo não somente deste ocorrido, mas bem como de toda denúncia de irregularidade, agimos de ofício naquilo que nos competia imediatamente, isto é, a determinar a abertura dos procedimentos legais previstos de investigação administrativa à Controladoria, órgão responsável pelo processo de investigação administrativa. A abertura destes procedimentos é necessariamente prevista em lei, já que não se pode, em observância à Constituição e às leis, julgar ou responsabilizar sumariamente qualquer pessoa que seja, pela prática de qualquer ato, seja em âmbito público ou privado, em processo administrativo ou judicial, sem garantir observância ao devido e regular processo legal, no qual deve ser permitido a qualquer acusado a apresentação de defesa e produção de provas.

JM - O senhor também é acusado de ter “furado” a fila, usando a prerrogativa da profissão, mesmo não atuando na linha de frente do combate à Covid. Afinal, o senhor furou a fila para tomar a vacina?

SÉTIMO – A acusação feita pela CEI foi a de que eu não poderia ter sido vacinado, na condição de Secretário de Saúde, nem de médico anestesista, pois eu teria formalmente me desligado das minhas atividades médicas. Em primeiro lugar, juntei na defesa declarações da Unimed, da CAUB (clínica de anestesistas) e do Hospital São Domingos de que em momento algum eu me desliguei das atividades médicas, inclusive tendo atuado com pacientes Covid em 2020. Havendo compatibilidade de horário, e desde que seja necessário, não há, portanto, impeditivo ou impossibilidade de eu ser chamado a atender algum paciente no Hospital São Domingos, em caráter de urgência, como é muito comum na minha especialidade, e assim estou à disposição. Paralelo à essa condição de médico não desligado da atividade, o amplo conceito de “trabalhadores de saúde” trazido pelo Plano Nacional de Imunização de 16/12/2020, como grupo prioritário, tomava por base a “manutenção do funcionamento dos serviços de saúde” como um todo, ao contrário do que restou concluído pela CEI, o que também autoriza minha vacinação. Por fim, para chancelar definitivamente a legalidade da minha vacinação, sobre esta denúncia em específico, o Ministério Público já se manifestou, determinando expressamente o arquivamento desta denúncia, concluindo não ter existido qualquer irregularidade ou ilegalidade na minha vacinação, em razão dos argumentos acima, expressamente mencionando que minha vacinação obedeceu as diretrizes das normativas, cuja decisão, inclusive, já juntei aos autos da Comissão Processante, e espero que seja reverberado ao conhecimento de todos os Srs. Vereadores.

JM – Uma das inconsistências levantadas pela Comissão Especial de Investigação que deu origem à Processante dizia que Uberaba não estava seguindo o Plano Nacional de Imunização (PNI), nem a respectiva Nota Técnica do Ministério da Saúde sobre a vacinação contra a Covid. Alguns depoimentos colhidos de servidores, inclusive, foram nesse sentido. Uberaba criou uma lista própria de prioridades para vacinar a população?

SÉTIMO – É importante primeiramente destacar que muitos servidores assim depuseram à CEI porque não tinham conhecimento exato do que previam o PNI de 16/12/2020, e o Informe Técnico do Ministério da Saúde de 19/01/2021, e demais normativas ali iniciais. Por isso a importância dos depoimentos colhidos sob compromisso e sob contraditório no âmbito da Processante, nos quais, uma vez trazidos ao conhecimento dos depoentes o teor destas normativas, todos concordaram que o conceito de ‘trabalhadores de saúde’ ali previsto era amplo, e que, ao contrário do que você pergunta, o Município seguiu tais diretrizes normativas do PNI e do Informe Técnico do MS. Não há como negarmos o que dizia o texto legal. Primeiramente, o PNI de 16/12/2020 trouxe na definição da ‘ordem de priorização’ (Item 3.5. - Pág. 22) que a mesma seguiria a diretriz de “preservação do funcionamento dos serviços de saúde”, o que foi expressamente previsto no Plano Municipal de Contingência, item 4. Além disso, o PNI previu em seu Anexo II (“Descrição dos Grupos Prioritários e Recomendações para Vacinação”) um conceito amplo dos “trabalhadores de saúde”, englobando não somente os profissionais da linha de frente, e sim todos os trabalhadores essenciais ao funcionamento dos serviços de saúde, inclusive trabalhadores de apoio administrativo, tais como recepcionistas dos serviços de saúde, motoristas de ambulâncias, seguranças, pessoal da limpeza, cozinheiros e auxiliares, ainda que não estejam prestando serviço direto de assistência à saúde das pessoas. Neste mesmo Anexo II o PNI previa a solicitação de documento ou declaração emitida pelos serviços de saúde, daí originando a solicitação das listas às instituições prioritárias, via email, feita antes de minha chegada à Secretaria de Saúde. E ainda, o Informe Técnico do Ministério da Saúde de 19/01/2021 (veja, apenas um dia antes de iniciar a vacinação) dizia no seu item “População-Alvo” que era facultado a Estados e Municípios a possibilidade de adequação da priorização conforme a realidade local. Assim, nesse contexto e diretriz de “preservar o funcionamento dos serviços de saúde”, o PNI e demais normativas abrangeram trabalhadores do âmbito administrativo dos serviços de saúde, públicos ou particulares. De se citar ainda a Deliberação CIB-SUS/MG nº 3.314 de 29/01/2021, do Estado de Minas Gerais, que expressamente previa em seu art. 1º, a vacinação dos trabalhadores administrativos do setor da saúde, incluindo laboratórios, antes do início da vacinação por idade.

JM – Houve vacinação indevida de pessoas nas listas enviadas pelas instituições de saúde, asilos, ou seja, das instituições incluídas nos grupos prioritários?

SÉTIMO – Como já dito, a solicitação de tais “declarações” estava prevista de forma expressa no PNI, e em Uberaba foi realizada através da solicitação às entidades, das listas contendo estes nomes dos grupos prioritários naquele início da campanha, via email. O pessoal da Central de Vacinação, bem como do Departamento de Vigilância Epidemiológica se desdobrou ao máximo para realizar a triagem de tais listas, e assim foi feito. Tanto que na defesa há destaque para ofícios, emails, comunicações de asilo e outras entidades expressamente mencionando que determinados nomes que constaram nas listas que enviaram não foram aceitos ou vacinados pela Central de Vacinação, solicitando reanálise. Bem assim também ofício expedido pelo próprio Hospital São Domingos em abril de 2021 solicitando doses para vacinação de profissionais de saúde que não foram vacinados lá no início da vacinação. Paralelo à esta triagem, a análise de eventual responsabilização sobre os nomes que chegaram até a SMS, deve ser feita junto às instituições que assim preencheram as declarações/listas. Quanto ao pessoal da SMS ligado diretamente à vacinação, como dito, desdobrava-se para, o máximo que podia, realizar a triagem de tais listas, e, tomando ciência de qualquer irregularidade, encaminhava à Controladoria.

JM – Outra inconsistência apontada pela CEI das Vacinas refere-se à convocação de pessoas para receber a vacina contra a Covid, que teria sido feita por servidores da Saúde. Quem autorizou esse chamamento? O senhor tinha conhecimento dessa situação?

SÉTIMO – Aqui reside outro contraponto ao afirmado pela CEI como segundo grave e irregular conduta: restou comprovado na defesa que os servidores agiram nesse caso conforme as diretrizes normativas. O já citado Informe Técnico do Ministério da Saúde de 19/01/2021, ao tratar do ‘Procedimento para a administração das vacinas’, expressamente previa em letras maiúsculas que, ao final do expediente e considerando a necessidade de otimizar doses ainda disponíveis em frascos abertos, a fim de evitar perdas técnicas, direcionar o uso da vacina para pessoas contempladas em alguns dos grupos prioritários do PNI, alertando para não deixar de vacinar e para não desperdiçar as vacinas existentes frascos multidoses abertos ao fim do expediente, o que se denomina vulgarmente como “xepa”. Assim sendo, evitando um ‘mal maior’, que seria o desperdício e perda de doses, e desde que se convocassem pessoas do grupo prioritário, a conduta mencionada obedece a normatização da vacinação.

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