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Augusto Afonso Neto

Gilberto Rezende
Publicado em 11/01/2022 às 20:23Atualizado em 18/12/2022 às 17:44
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“Estou desesperado – vão protestar meus títulos amanhã”. Ao receber esta notícia, percebi que a situação era grave e pedi a imediata presença do cliente em meu escritório.

Nossa empresa, Sociedade Comercial Santo Antônio Ltda., distribuidora de máquinas Olivetti, era também um escritório de contabilidade, com centenas de clientes esparramados por uma vasta região do Triângulo Mineiro.

Esse cliente do ramo madeireiro, dado às dificuldades de levantar novos empréstimos e até mesmo de prorrogar os débitos vencidos, estava sujeito a ter seus títulos levados a protesto, subordinando-se, daí em diante, à vexatória condição de ver seus bens arrestados e leiloados pelos seus credores.

No cenário do início da década de 1960, acontecia a renúncia de Jânio Quadros, as restrições à posse do Vice João Goulart e as periódicas agitações urbanas e rurais, que traziam insegurança, inflação, dificuldades de créditos bancários, prejudicando a economia e a vida dos que queriam trabalhar.

No caso específico deste cliente, a única solução era o remédio legal, chamado de Concordata Preventiva, hoje sob o nome de Recuperação Judicial. Afinal, ele poderia obter dois anos para pagar seus débitos, que, naquela época, não eram onerados com juros moratórios.

Nossos funcionários foram convocados a trabalhar por toda a noite, a fim de que a papelada necessária estivesse em condições de ser protocolada no dia seguinte no Cartório, localizado onde hoje é o Edifício Chapadão.

Era a sexta Concordata que iríamos preparar para ser levada ao Dr. Augusto Afonso Neto, para fazer a petição e, também, o contrato para atuar na causa até sua liquidação.

Éramos vizinhos. O escritório de nossa empresa ficava na rua Padre Jerônimo e o escritório do dr. Augusto, na esquina da avenida Guilherme Ferreira. Ali, por 60 anos, foi o ponto de encontro de todos aqueles – pessoas físicas ou jurídicas – que necessitassem de apoio, via judicial, para solução de seus problemas.

Foi mais um cliente satisfeito através do deferimento da Concordata Preventiva.

A competência de Dr. Augusto Afonso Neto na área de Direito Tributário, Falências e Concordatas era reconhecida em vários estados do Brasil. Seu livro “Princípios de Direito Falimentar” tornou-se a Bíblia dos advogados de endividadas empresas.

Além de atuar no campo jurídico, foi também um dos grandes benfeitores que Uberaba conheceu, participando intensamente dos setores filantrópicos, educacionais e literários.

Augusto Afonso Neto nasceu em 13 de janeiro de 1907, na cidade de Sacramento, onde fez seus primeiros estudos. Mudou-se para São Paulo para cursar o Ginasial no Mosteiro São Bento, onde recebeu três medalhas de ouro por ter conseguido as melhores notas. Ele se graduou em Direito na Faculdade do Largo São Francisco.

Formou-se ainda em Filosofia, na Faculdade agregada à Universidade Horaina – Bélgica, mantida pelo Mosteiro de São Bento, conforme relata o Professor Décio Bragança Silva, em seu livro “A História Viva de Uberaba”.

Depois de exercer por um ano a função de delegado no distrito de Santo André-SP, no período da Revolução Liberal liderada por Getúlio Vargas no ano de 1930, abriu seu primeiro escritório de advocacia. Com a revolta dos paulistas, ocasião em que eclodiu a revolução de 1932, Dr. Augusto Afonso Neto preferiu voltar para Sacramento, onde exerceu a função de promotor de Justiça por um pequeno período.

Disposto a seguir a carreira de seus sonhos, a advocacia, mudou-se para Uberaba. Sem disputa, presidiu a OAB, de 1967 a 1969, e, por indicação do então vereador João Fatureto, recebeu da Câmara Municipal o título de Cidadão Honorário de Uberaba.

Em 1968, participou do grupo de advogados, composto entre outros por Edson Gonçalves Prata, Ronaldo Cunha Campos, Jarbas Leone Varanda, George de Chirée Jardim e Guido Bilharinho, na fundação do Instituto dos Advogados do Triângulo Mineiro.

Sua atuação como membro da comunidade de Uberaba é marcante. Colaborou com várias entidades vinculadas à prestação de serviços, era membro do Rotary Uberaba-Sul, contribuiu sobremaneira com inúmeras instituições da área educacional, atitudes estas reconhecidas e retribuídas com homenagens.

Em 1984, a OAB, seção de Uberaba, outorgou-lhe o título de Advogado do Ano, na gestão de Aluízio Ignácio de Oliveira, ocasião em que foi saudado pelo mestre Homero Vieira de Freitas.

Por indicação do Juiz Sebastião Naves de Rezende, uma das salas do Fórum Melo Viana ostenta seu nome.

Entre seus trabalhos em prol da comunidade podem ser destacados, na sua função de Técnico em Assuntos Educacionais, sua participação junto com o Dr. Mozart Furtado Nunes na estruturação da Faculdade de Medicina; sua cooperação na fundação da Fista – Faculdade Santo Tomás de Aquino, ao lado das Irmãs Dominicanas; sua contribuição ao Professor Mário Palmério na criação da Uniube; sua assistência aos Irmãos Maristas no Colégio Diocesano; seu apoio ao Dr. Alexandre Saad na fundação do Colégio Osvaldo Cruz; apoio também ao Professor Erwin Puhler na criação do Colégio Cristo Rei, e, ainda, ao Dr. Rubem Jácomo, então diretor do Colégio José Ferreira, bem como sua cooperação a muitos outros colégios de Uberaba.

Como Professor, lecionou na Escola de Comércio José Bonifácio. Na Faculdade de Direito era responsável pela disciplina Direito Falimentar e Direito Comercial, formando mais de 40 turmas; na Faculdade de Zootecnia lecionava Direito Rural e na Faculdade de Ciências Econômicas era responsável pela matéria Instituição de Direito Público e Privado.

Foi diretor da Aciu nas gestões de Fidélis Reis, João Fernandes Corrêa, Lívio da Costa Pereira e Helmut Dornfeld, tendo participação ativa na solução dos problemas do asfaltamento do campo de pouso e do pátio de manobras do Aeroporto Mário Franco de Uberaba e da implantação asfáltica da BR-262 com destino a Belo Horizonte, além da BR-50, trecho rumo a Uberlândia.

Conta José Mousinho Teixeira que Dr. Augusto foi quem levou Paulo Vicente de Souza Lima à diretoria da Aciu, na época da presidência de Léo Derenusson, em 1965, com a sugestão para que fosse criada a Faculdade de Ciências Econômicas.

Por indicação do então presidente da Aciu, José Miguel Árabe, Dr. Augusto Afonso Neto foi nomeado diretor de Ensino das Faculdades vinculadas à Entidade, cargo em que permaneceu por 15 anos. Recebeu da Aciu em 1986 o título de Sócio Benemérito.

Dr. Augusto Afonso Neto participou da Academia de Letras, sendo um de seus fundadores em 1962; entidade foi idealizada por Edson Prata. Ocupou a Cadeira de n.º 13 e foi eleito vice-presidente na primeira gestão da Entidade, presidida pelo Dr. José Mendonça.

Chegou a assumir a presidência em agosto de 1968, oportunidade em que iniciou seu trabalho para viabilizar o lançamento do livro de Hidelbrando Pontes, que ocorreu já na gestão de Dr. Edson Prata.

Sua vida nas cidades de São Paulo, Sacramento e Uberaba, participando de Congressos Jurídicos, Seminários, Palestras e outros diversos tipos de atividades, culminou com a publicação de mais de 500 artigos.

Augusto Afonso Neto faleceu em 27 de setembro de 1994, aos 87 anos de idade. Foi casado com Isaura Neto e deixou os filhos João Mauricio, Rogério (hoje ambos já falecidos), José Augusto e Alice.

Nas palavras do empresário e escritor Joaquim Prata dos Santos, publicadas no mesmo ano no Jornal Lavoura e Comércio, pode-se mensurar o seu valor – “Na rica constelação de valores humanos, Dr. Augusto Afonso Neto sempre se destacou como estrela de 1ª. Grandeza pela sua participação fecunda na vida social, cultural e empresarial na cidade de Uberaba, que teve o privilégio e a honra por longa data de outorgar-lhe por justiça e por direito o título de sua cidadania, ao qual fez jus pelos relevantes serviços prestados à comunidade local.”

Fontes: Décio Bragança Silva – Livro – “A História Viva de Uberaba”/ALTM – Academia de Letras do Triângulo Mineiro/José Mousinho Teixeira/César Vanucci – presidente da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais e decano da Academia de Letras do Triângulo Mineiro/Flamarion Batista Leite – Ex-presidente da Aciu/Guido Bilharinho – Livro “Uberaba - Dois Séculos de História” - Vol. II/Aciu – Associação Comercial e Industrial de Uberaba

Gilberto de Andrade Rezende

Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro. Ex-presidente e conselheiro da Aciu e do Cigra

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