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O Jardineiro

Ricardo Motta
Publicado em 21/09/2021 às 19:42Atualizado em 18/12/2022 às 15:59
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Chegara em casa logo após o entardecer. Parecia levemente cansado pela labuta do dia. Amava o que fazia, por isso o trabalho não lhe era um peso. Após um banho, gostava de rememorar o dia de serviço e pensar no amanhã. Daquele dia, lembrava-se das lindas borboletas azuis que surgiram misturando a outras mais comuns por ali, também tão lindas, que há dias já estavam a pousar de flor em flor. As orquídeas, enfim, surgiram novamente. Cultivara a roseira e mexeu bem a terra dos canteiros. Mais belas estavam as flores multicores naquela primavera. Podou a folhagem, adubou o solo, molhou a grama que já pedia novo aparo. Pensou. Pelo menos a esse tempo são mais raras as folhas caídas que teria que recolher. O outono já se foi há algum tempo. Lembrou-se de o padre falar sobre os lírios do campo, deviam estar lindos. Vagava distraído nos seus pensamentos, quase sonhando, quando ouviu o chamado da esposa: – Vem jantar! Terminou o pito e caminhou para a cozinha. Sentou-se no canto de sempre, olhou o prato já servido, tomou o garfo e, silenciosamente, ia iniciar sua refeição, quando novamente a esposa comentou: – Não tem carne de novo. Está muito cara. Mas colhi um ovo. Dizem que é a crise. O jardineiro, mudo, ouviu serenamente. Contemplou a mulher com ternura. Terminou de mastigar. Alheio, volveu novamente o olhar para a esposa e disse com a suavidade do seu ser: – Vou dormir, o trabalhoso inverno passou, mas agora estou preocupado com algumas lagartas que estão dando nas folhas de minhas hortênsias. E exclamou ao final: – Tenho que ficar sempre atento. As estações sempre mudam! Boa noite.

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