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Quita Costa Próspero – Uma fulgurante mulher

Gilberto Rezende
Publicado em 20/09/2021 às 20:52Atualizado em 18/12/2022 às 16:01
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 O burburinho era grande na casa. Gente correndo para todos os lados, cabeleireiras, costureiras e manicure se revezando no atendimento dentro do quarto. Na sala, um joalheiro e um entregador de sapatos esperavam pacientemente sua vez. Esse dia especial, um grande acontecimento, exigia que tudo fosse minuciosamente revisado, nada deveria ser esquecido. Afinal, a primeira-dama Quita Próspero e seu marido, prefeito Dr. Antônio Próspero, tinham um encontro com o presidente da República, Getúlio Vargas, e com o governador de Minas Gerais, Juscelino Kubitschek, na Câmara Municipal de Uberaba.     

De porte esguio, Quita Próspero, elegantemente vestida sem muitos adornos, dispensáveis naquele momento já que era ela a grande atração, e para quem todos os olhares convergiam, recebeu com carinho a festa que os presentes fizeram com a entrada do casal.    

O presidente da Câmara, Dr. José Humberto Rodrigues da Cunha, acompanhado dos vereadores, entre eles, Ataliba Guaritá Neto (Netinho), Wilson de Paiva, Randolfo Borges Júnior e Helena de Brito, primeira mulher eleita vereadora, saudou o Presidente da República, o Governador de Minas,  o Prefeito, o deputado Mário Palmério e, como era dia de 3 de maio de 1951, data de abertura da XVII exposição de gado, referenciou e reverenciou  os diretores da SRTM (ABCZ), entre eles, Carlos Smith (presidente), Adalberto Pena, Hildo Totti e Antônio José Loureiro Borges.  

Getúlio Vargas, que por diversas vezes estivera em Uberaba como Chefe de um Governo Ditatorial (1937/1945), desta vez, na função de Presidente da República, democraticamente eleito em 1950, fez as saudações de praxe e proferiu discurso em homenagem a Antônio Próspero, enaltecendo suas virtudes como Chefe do Executivo.    

Nesse momento, visivelmente emocionada e ostentando na face um discreto sorriso, Quita Próspero foi mais uma vez alvo da atenção dos presentes. Ela sabia, como todos ali, que os elogios recebidos pelo seu marido eram, em grande parte, devido ao seu trabalho. Sabia também que era uma honra imensurável para todos os cidadãos, e para Uberaba, pela primeira vez um Presidente da República reconhecer publicamente as virtudes de um Prefeito.

Durante toda a cerimônia, Quita Próspero se sentiu prestigiada nestas homenagens, pois foi por sua interferência que Uberaba se tornou a primeira cidade do Brasil a oferecer merenda escolar para os alunos de todas as escolas municipais, fato que atraiu a atenção de todo o país, fazendo com que muitos municípios seguissem o exemplo.     

Quita Próspero nasceu em Uberaba no dia 28 de fevereiro de 1914, ano do início da Primeira Guerra Mundial, vaticínio de que sua vida seria também voltada para revolucionar costumes. De sua união com dr. Antônio Próspero, em 4 de julho de 1944, por coincidência, em plena Segunda Guerra Mundial, nasceu seu filho Luiz Próspero Neto.     

Mulher de espírito arrojado e amante das artes, Quita era também dotada de uma invejável cultura. Destemida, aos 19 anos, escreveu um artigo bem fundamentado sobre o divórcio, uma ousadia, considerando os preceitos estabelecidos na religião católica. A atitude provocou resposta da Igreja nas palavras do padre Francisco Curvelo, no jornal Correio Católico. 

Quita não se esmoreceu, segundo relata Jorge A. Nabut (Jornal da Manhã), mantendo sua posição e demonstrando surpreendente erudição por meio de uma tréplica publicada no jornal Quiriri – Orgão do Centro de Cultura de Uberaba, edição de 20 de maio de 1934. Seu tema sobre o divórcio, tão ardorosamente defendido naquele ano, só foi aceito e legalizado em 1977, 43 anos depois. 

Foi colaboradora de jornais e revistas de todo o país, inclusive da famosa revista da época, “O Cruzeiro”. Sua paixão pela cultura impulsionou a criação de grupos teatrais, provocando o reconhecimento público do talento dos artistas de Uberaba. 

Conta o teatrólogo Reynaldo Domingos Ferreira em as Mulheres Importantes para a Cultura de Uberaba que, sob os auspícios de Quita Próspero, foi criado o Teatro dos Estudantes. Ela deu suporte para a criação de um grupo de teatro denominado Grupo Quita Próspero e sob sua direção foi realizada a primeira, e única, Semana do Teatro em Uberaba. Esse evento, além de apresentar vários autores brasileiros, até mesmo um do Triângulo Mineiro, contou com a presença do embaixador Paschoal Carlos Magno, criador do Teatro do Estudante do Rio Janeiro.      

Reynaldo diz ainda que a primeira-dama se entusiasmava tanto com o desempenho dos atores do Teatro do Estudante que acompanhou por duas vezes o grupo em apresentações em Sacramento.     

Quita se destacou também na área educacional, contribuindo para marcar a gestão de Antônio Próspero. Graças à sua iniciativa é que se regulamentou o ensino rural, o que permitiu a efetivação e a nomeação de professores para lecionarem nessa área.

Sua inteligência e dinamismo, que contribuíram grandemente para a educação e a cultura, espalhavam-se pela literatura, e fizeram-se sentir, inclusive, na área esportiva, uma vez que a presença de Quita Próspero foi exigida como madrinha dos jogadores de vôlei nos Jogos Abertos do Interior e nos jogos da Alta Mogiana, conforme descrito por Jorge Nabut (Jornal da Manhã). 

Em janeiro de 1957, o cronista social Herculano Rodrigues Naves apresenta no Jornal de Uberaba a lista das dez mulheres mais elegantes de 1956. Ao lado de Adélia Machado, Stela Terra, Anete França, Maria do Rosário Borges, Celuta Leite, Naná R. da Cunha, Célia R. da Cunha, Diná Cunha da Cruz, Anete França e Maria Alice Terra, o nome de Quita Próspero era o nome óbvio para receber o destaque, pois a elegância lhe era intrínseca e ela a esbanjava de forma natural.

Quita Costa Próspero fundou, em 15 de setembro de 1948, a Sociedade de Amparo aos Lázaros, da qual foi diretora, em companhia de Maria da Glória Leão Borges, Raula de Chirré Jardim, Terezinha Maciotti, Eunice Soares Mendes e Laura Sabino de Oliveira, conforme relata Guido Bilharinho.    

Aos 66 anos de idade, ela ficou viúva e passou a se dedicar de corpo e alma à filantropia. Participou ativamente como Conselheira de diversas entidades.  Foi uma das mais fulgurantes figuras femininas que Uberaba já conheceu. Faleceu em 10 de julho de 1996, aos 82 anos.     

A Câmara Municipal de Uberaba, por meio da Lei 7.885, de 22 de março de 2001, aprovou o Projeto 115/01, de autoria do vereador Hilton Delduque, autorizando a denominar “Quita Próspero” logradouro público em Uberaba.

Fontes: Luiz Próspero (filho de Antônio e Quita), Guido Bilharinho, Reynaldo Domingos Ferreira, Jorge Alberto Nabut e Superintendência do Arquivo Público de Uberaba

Gilberto de Andrade Rezende - Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro – Ex-presidente e Conselheiro da Aciu e do Cigra 

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