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20 de Novembro: Um dia de resistência e persistência

Maria Cristina de Souza
Publicado em 19/11/2020 às 19:15Atualizado em 18/12/2022 às 10:51
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O advogado e filósofo Silvio Almeida define racismo como algo estrutural – ou seja, que está incorporado na estrutura da sociedade, na sua forma de organização – e, assim, se manifesta por meio de práticas conscientes e inconscientes trazendo desvantagens a um grupo social, no caso, a população negra. São esses aspectos que a tornam alvo de práticas discriminatórias de maneira a se formar desenvolver uma espécie de padrão racional de normalidade que oculta injustiças.

No Brasil, o IBGE aponta uma grande diferença no acesso entre níveis de ensino pela população negra. Das pessoas entre 15 e 24 anos que frequentavam o nível superior, 31,1% dos estudantes eram brancos, enquanto apenas 12,8% eram negros, e 13,4%, pardos. Vemos ainda que a a taxa de analfabetismo no Brasil, em média, é de 9,6%; entre os brancos, esse índice cai para 5,9%; entre pardos e pretos, a taxa sobe para 13% e 14,4%, respectivamente. Padrão similar se observa em relação ao índice de desemprego. No primeiro trimestre de 2019, os dados apontavam pessoas brancas (10,2%) abaixo da média nacional (12,7%), enquanto pretos (16%) e pardos (14,5%) ficaram acima.

Segundo dados do Ipea, o rendimento médio mensal dos brancos no Brasil chegou a R$ 1.780,60 em 2017 quase o dobro do valor relativo às pessoas negras (R$ 1.012,76). A disparidade de renda entre negros e brancos reflete, entre outras coisas, a desigualdade no trabalho. De acordo com o Instituto Ethos, em 2017, nas 500 maiores empresas com operação no Brasil, menos [5% dos cargos executivos são ocupados por pessoas negras, e apenas 6,3% estão em cargos de gerência.

Na área da saúde a situação não é diferente. Análise do Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil aponta que negros e pardos tendem a usufruir em menor proporção serviços de saúde pelo SUS. Dados sobre o exame de pré-natal mostram que 71% das mães de filhos brancos fizeram mais de sete consultas no período de2009 a 2010 enquanto mães de filhos pretos e pardos, foram de 28,6% inferior a mãe brancas ,. Em um país desigual como o nosso, a epidemia do coronavírus evidenciou as desvantagens da população negra em relação a prevenção e tratamento da doença. Os poucos estudos feitos até o momento apontam que a doença tem letalidade maior entre negros do que entre brancos.

Desse modo, falar de consciência negra é sempre urgente e necessário para explicitar as desvantagens sociais presentes como decorrência do racismo. A afirmação do historiador e filósofo camaronês Achille Mbembe, a existência do povo negro “como imagem de uma existência subalterna` é mediada o nascer, viver, adoecer e morrer da população negra por condições de miserabilidade, de privação de direitos, de moradia e de emprego formal, transformando os que estão fora deste perfil exceções que são usadas para escamotear a regra imposta pelas condições sociológicas e históricas do Pais , são corroboradas pelos dados acima que demonstram a vulnerabilidade da população negra no Brasil.

Assim o Dia da Consciência Negra significa a afirmação da história povo negro no Brasil. Considero fundamental que a data seja mantida nos calendários como marco da resistência ao sistema escravocrata vigente que nos traz a necessidade de seguir lutando contra o racismo e o apagamento da história e legado do povo negro na construção do país.

20 de novembro é a vitória de uma geração de intelectuais do movimento negro brasileiro, que reivindicaram o reconhecimento da luta constante pelo fim do racismo. Não se trata de um dia exclusivo do povo negro, mas uma data indispensável para negros e brancos que se levantam em um movimento antirracista e utilizam o dia para denunciar o quanto dados e indicadores, como os mencionados acima, reafirmam a  importância luta contínua pela igualdade sociorracial.

Trata-se, enfim, de uma data de denúncia, de balanço e também de comemorações pelas conquistas. A superação do racismo perpassa um movimento  que incorpore os vários segmentos da sociedade, por uma sociedade que compreende o racismo como parte atrelada aos processos de exploração e de opressão que precisam ser superados.

Maria Cristina de Souza - Doutora em Serviço Social

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