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A Pequena Notável

Cesar Ladeira tinha o dom de criar bordões – expressões que marcavam popularmente os artistas

Ilcéa Borba Marquez
Publicado em 14/01/2020 às 17:39Atualizado em 18/12/2022 às 03:31
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Cesar Ladeira tinha o dom de criar bordões – expressões que marcavam popularmente os artistas – e para Carmem Miranda “A Pequena Notável” aderiu em definitivo à sua imagem no Brasil. Isto aconteceu em 1933, na Rádio Mayrink Veiga, Rio de Janeiro – onde Carmem se apresentava toda sexta-feira, às oito da noite. Se o Brasil a reverenciava sob esta nominação, no exterior ficou conhecida como “Brazilian bombshell” – (sex symbol), tornando-se assim uma das primeiras a expandir seu sucesso aos Estados Unidos da América. 

De acordo com Ruy Castro, no livro Carmem, pequena significava menina, e não se referia à sua baixa estatura, que em verdade não passava de 1,53. Nesta época, ela ainda não havia criado a famosa baiana e seus turbantes, nem tão pouco as sandálias com plataforma, que desde Nova York compunham sua imagem acrescida de 15 centímetros.

De 1930 a 1939, Carmem Miranda foi a maior estrela do disco, radio, show e cinema nacional. Ela tinha um jeito próprio de cantar sambas, cujas letras passavam mensagens de duplos sentidos, com olhares, gestos e expressão corporal marcados pela malícia. Sua encenação, criada e aperfeiçoada detalhadamente, trouxe alegria aos palcos brasileiros, fugindo do estereótipo de tristeza que os Fados Portugueses traziam essencialmente. As portuguesas cantavam as dores da separação imposta pelos navios que levavam seus companheiros para longe, talvez definitivamente. Ela cantava a alegria, a malandragem e o ritmo verdadeiramente brasileiros. Assim, o brasileiro se separou do colonizador ao permitir a alegria e a leveza da vida que gera, por fim, um sotaque aberto e cantante, que podemos reconhecer como brasileiro.

Em maio de 1939, no dia 17, o navio Uruguay atracou em Nova York, levando A Pequena Notável e o Bando da Lua para uma temporada que se tornaria definitiva. Carmem estava amparada por um contrato de trabalho com Lee Shubert, mas tinha que fazer sucesso num outro país, acostumado aos Blues, Jazz e gospel, nitidamente distantes da batida do samba e do gingado da baiana. Não podemos esquecer que ela não falava inglês e não fez esforço para aprender sua gramática. O fato de estar habituada aos sons e ritmos fazia com que fosse capaz de repetir diálogos e letras musicais sem dominar a língua. Corajosamente, reiniciou nova carreira artística, tendo que dar conta da avidez de seus contratadores, que a obrigavam a quatro shows por dia nos sete dias da semana, mais as filmagens na Paramount, além de fotos promocionais, ensaios e aparições de divulgação. Uma programação extenuante, que a impedia de descansos, e, assim, foi capturada pelas “pílulas mágicas”, de sérias consequências futuras. O que ninguém suspeitava é que no íntimo dessa guerreira existia uma mulher que só desejava um lar cheio de crianças e muito amor.

(*) Psicóloga e psicanalista

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