Não faço análise literária, aqui, porque não tenho formação acadêmica para tal. Traço compreensões que tive ao ler o romance do escritor uberabense José Humberto Henriques
Não faço análise literária, aqui, porque não tenho formação acadêmica para tal. Traço compreensões que tive ao ler o romance do escritor uberabense José Humberto Henriques. O livro chegou às minhas mãos, com dedicatória dele, através de minha filha Eloá. Resolvi encará-lo. É puro cerrado literário, de português apuradíssimo, com os seus biomas diversos. Confesso que, por várias vezes, o abandonei num canto, mas o livro não se conformava, e me convocava ao desafio de lê-lo página por página. Então, por pura teimosia do livro, voltei a encará-lo. De cara limpa, de forma seca, porém, determinado à compreensão.
Resolvi, assim, não mais pensar no autor; médico, de fino trato, de vocabulário impecável, e, pensar no escritor; homem do campo, conhecedor de plantas, do movimento do rio, da fala indecifrável dos pássaros, do comportamento dos animais mesmo fora do cio, observador de comportamentos humanos, poeta, escritor. Página após página, o livro abriu, vagarosamente, as suas comportas e eu me afoguei em seus personagens. Esses de uma linguagem não minha, e sim, daqueles que vivem às margens do Rio Doce, que olham o mato e, quem sabe, dialogam com bichos numa cidadezinha chamada Tumiritinga, no noroeste de Minas Gerais.
O autor ao discorrê-los, que não são menos interessantes dos que aquelas que conhecemos na cidade, mas, diferentemente pela naturalidade do convívio, me envolveu sem que eu o quisesse. Aos poucos eles se abrem em sonhos de desejos, de sexualidade latejante nas escolhas não escolhidas São mulheres de pouca fala e de desejos escondidos, homens rústicos e suaves no trato, estranhos e compreensivos na desconfiança, contadores de causos e silenciosos, fazem desta cidadezinha a síntese de nossa diversidade humana.
De fundo, o cerrado, com o seu bioma diverso marcando aqueles que o tocam. Nouvelle é literatura pura, é fôlego de quem quer se comunicar através da vida desconhecida do ribeirinho, do homem do campo. Onde homens e mulheres se harmonizam com o bem-te-vi, a rolinha caldo de feijão, sem se esquecer de formigas, lesmas, gaviões, “passupreto”, e, tantos outros, numa vegetação que alimenta ou intoxica. Porém, não há inocência, e sim simplicidade aguçada.
Nouvelle seria filosofia, se filosofia fosse sabedoria, daqueles que veem o mundo pela janela larga do horizonte florido, cravado de sol e chuva, de roçado e plantio, de colheitas e perdas; retirando o conhecimento daquilo que está posto, porque ensina. Nouvelle é um romance existente no mundo dos irracionais copiado pelos racionais, é um libertar de emoções do leitor que não consegue concluir as palavras do autor, porque não são as suas.
Por ele não permitir conclusões apressadas, é preciso, portanto, lê-lo para saber o que está sendo dito e, depois, parar e refletir. Aos que gostam de aridez que jorra água, ler Nouvelle é um encontro com o imponderável. Se se pensar que tudo isso são realidades longe de nós, Nouvelle nos aproxima. Lê-lo é um desafio assim como o é o misticismo, que nos encanta, mas ilude os nossos sentidos. Que os digam os caçadores de jiboias e de fantasmas.
(*) professor