Era Raimundo. Mais precisamente, Nonato
Era Raimundo. Mais precisamente, Nonato. Das bandas do norte, saído em Minas por acaso.
Trejeitos macios, macioso na fala, no andar moreno.
Logo, logo, toma conta do lugar. Conhecido de todos. Nonato me acode, lá vai ele. Pra arrumação de casa ou pro recado. Conquistando todo mundo. Meninada fazendo procissão por um dedo de prosa. Sobrancelhas arqueadas, olhar dardejando, maluquice das histórias. Lobisomem, noite de lua cheia em tempo de quaresma.
Nonato manhoso. Conversador. Na admiração de tudo, beleza da banda da praça, povão fardado. Imponência só. Tocando cachimbão. Não sabe o nome do instrumento. Parecendo mesmo um cachimbão. Boniteza no brilho do metal. Nonato vibrando na vontade de tocar um pouquinho que fosse, o pessoal admirando sua elegância. Beleza de música, gestos acompanhando o repique.
Risadas matreiras. Notícia de tudo. Eleições à vista, vai ganhar o Lavinho para prefeito. A voz é do povo. Nonato garantindo torcida de grupinhos nas esquinas. Ele correndo de cá pra lá. Nem pensassem em Toledo. Voz do povo. E de Deus. Do nosso lado. Do lado de todo mundo. Entusiasmo e bicaria. No agrado. Descansa, povão. Lavinho ganha. O gosto da festança. Preferido, sim senhor. Ninguém de igual dote, cabra valente, de fato candidato pra qualquer eleitorado. Pra vitória. Contasse com ele no trabalho de arrebanhar voto. Sabe das coisas, da matreirice política, aprendida em seus rincões...
Alegria contagiante. Na crença da vitória. Nonato andando, ir e vir, fala e convencimento. Informações precisas. Avexassem não. Ganho certo. E ele seria o primeiro a dar notícias. Aí pra falar. A fazer a festança. Correr nas roças, mandando preparar arrasta-pé.
Apreensão. Expectativa. Nonato no indo e vindo. Nas filas de votação, a pesquisa pé de ouvido, lesando a secretice do voto. Convencimento. Vota no Lavinho. É bom de verdade. Emprego pra todo mundo. Vão por mim. Vez por outra, um contra: o voto é secreto, moço. A sengraceza, passageira, precisa trabalhar, garantir Lavinho.
Passeata da vitória. Surpresa da política. Caminhão com banda e tudo. Tilintando ao sol da manhã. Toledo em cima. Garboso, repimpão. Euforia só, na música repicada, em meio aos vivas: Toledo!!! Toledo!!!
Bem no centro, Nonato segurando o cachimbão. Feliz da vida. Comemorando Toledo. Riso só.
Nota: Crônica do livro Assim como nós, a ser lançado neste semestre.
(*) Educadora do Colégio Nossa Senhora das Graças e membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro