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Livros serão encontrados nos bons museus

A entrevista de Irwin Jacobs na Folha de São Paulo me deixou assustado

Padre Prata
Publicado em 06/08/2011 às 20:13Atualizado em 17/12/2022 às 07:22
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A entrevista de Irwin Jacobs na Folha de São Paulo me deixou assustado. Se dependesse de mim, eu gostaria de viver mais uns 10 anos. Não por vontade de viver tanto, mas por curiosidade pelas incríveis coisas que estão por acontecer. Infelizmente, é uma curiosidade que não posso alimentar. Eu gostaria de saber até onde nos vai levar a ciência eletrônica, de um modo especial, o celular.

Na raia número um, em primeiro lugar, corre o Sr. Irwin Jacobs. Um pobrezinho setentão, dono de apenas um bilhão e seiscentos milhões de dólares. Pois bem, o referido senhor, brevemente, lançará no mercado um novo celular que reconhece com quem você está falando, permite conversar em português com alguém que só sabe falar inglês. Tem mais. A minúscula obra de arte reproduz filmes e os armazena. Admiro e louvo, mas, apreensivo, me pergunt até onde vamos? Penso nos livros.

O primeiro instrumento dos homens na transmissão de dados históricos era a tradição oral. Exemplo é a Bíblia. Os fatos somente foram escritos centenas de anos depois de acontecidos. As tradições eram guardadas na memória e transmitidas de geração para geração por via oral. Contavam as histórias. Vieram depois os papiros (material vegetal), depois os pergaminhos, onde as letras eram grafadas em couro de carneiro. Eram rolos imensos que iam sendo desdobrados para a leitura. Os pergaminhos conservados pelos monges medievais eram obras de arte, com iluminuras e desenhos artísticos. Qualquer museu conserva exemplares deles.

No século 15 aparece Gutenberg, com os caracteres móveis. Estava descoberta a imprensa. Os pergaminhos foram aos poucos levados para os museus onde descansam com pouca serventia. O século vinte iniciou outra mudança: a eletrônica. O progresso foi violentamente rápido. As letras impressas foram substituídas pelo chips. Podia-se ler o que se quisesse apenas clicando uma tecla. Milhões de livros foram condensados em pequenos aparelhos e guardados nos bolsos. E os livros? Como os pergaminhos, irão para os museus.

Nós, das gerações adultas, líamos com prazer. Os livros eram dados como grandes presentes. Todos nós, quando crianças e adolescentes, éramos envolvidos pelos livros. Começamos com os contos de fadas, duendes, ogros, feiticeiras. Depois passamos para os autores de aventuras, Júlio Verne, Karl May, Burroughs (Tarzan). Nas escolas, vivíamos no meio de livros. Em nossa idade, ainda hoje são os livros os nossos maiores amigos. É um prazer comprar um bom livro.

E hoje, o que vemos? As crianças não leem mais. Não ganham livros de presente. Os pequenos aparelhos eletrônicos estão na mão de todos. Aos poucos, os computadores jogam os livros para as estantes. As crianças escrevem mal, mas são hábeis em clicar botões eletrônicos. Dão-nos aulas frente a um computador. Crianças de seis, sete, oitos anos, já navegam na Internet. Aprendem por intuição, como se tivessem nascido com chips na cabeça. Eles não vão entender como éramos tão atrasados.

Tenho a impressão de que, se eu vivesse mais dez anos, não conseguiria entender o que estava se passando. Vai ser outro mundo. A cultura vai consistir em saber clicar o botão certo.

 

(*) Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro

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