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Humberto de Campos e o senhor uberabense

Verificamos que o senhor uberabense que procurou o autor das Memórias e Memórias Inacabadas, à porta da Casa de Saúde Dr. Eiras, concluiu que onde se chora não há rosas

Elias Barbosa
Publicado em 03/08/2018 às 10:18Atualizado em 20/12/2022 às 11:51
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Verificamos que o senhor uberabense que procurou o autor das Memórias e Memórias Inacabadas, à porta da Casa de Saúde Dr. Eiras, concluiu que onde se chora não há rosas nem lírios. Ao que o grande prosador e poeta maranhense Humberto deu prosseguimento ao diálog

“— E como demonstram os senhores, por lá, aos mortos, a saudade dos vivos?

— Pela caridade. Quando morre uma pessoa altamente estimada, os amigos que vão ao enterro se cotizam, contribuindo com a importância das coroas que iam adquirir, e cujo produto é destinado às associações de beneficência. E é graças a isso que temos, em Uberaba, instituições caridosas como não as possui nenhuma outra cidade mineira. O hábito está, mesmo, se enraizando de tal modo que, hoje, não morre um homem de fortuna sem deixar, no testamento, um legado aos hospitais da cidade, e de fora... Um enterro de personagem de relevo social, sabe quanto rende para os hospitais que mantemos? Oito, dez contos de réis. E, como o defunto sempre deixa alguma coisa para esses estabelecimentos, cada morte que ali se registra nas camadas superiores da sociedade resulta em benefício dos pobres. E não acha o senhor preferível fornecer pão a um cego durante um ano, com duzentos mil-réis, ou salvar um tuberculoso com a medicação oportuna, do que lançar sobre um monte de areia algumas dúzias de camélias espetadas em arame, que custaram aquela quantia e que, dois dias depois, não servirão senão para juntar mosquitos?

O cavalheiro dizia isso e esgaravatava o chão, entre os paralelepípedos. À medida, porém, que se entusiasmava com os seus próprios argumentos, levantava o rosto e fitava-me, como quem exige uma resposta.

— Que pensa o senhor disso? Não acha que é uma iniciativa digna de ser imitada no Rio de Janeiro? Eu me encontrava aqui, em visita a uma filha casada, quando faleceu o Miguel Couto. E vi as flores que os seus amigos lhe mandaram. Avaliaram as coroas em quase uma centena de contos... Ora, diga-me o senhor: com cem contos de réis, quantas vidas não seriam salvas na Santa Casa, na Pró-Matre, no Asilo São Luís, no Hospital dos Lázaros, no Sanatório D. Amélia, na Liga Contra a Tuberculose, na Policlínica Geral, no Hospital Hahnemanniano, ou no de São Francisco de Assis?”

Fiquemos por aqui, hoje, prezado leitor, prosseguindo na próxima semana.

(*) clínico geral e psiquiatra

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