Hoje podemos encontrar ações de indenização exitosas que tratam da desobediência aos direitos coligados a família, mas raramente ao direito sucessório.
Entendendo por normas do direito de família aquelas que dizem respeito a relação paterno filial, fraternal ou marital. Já no direito sucessório deve envolver os coerdeiros e o falecido.
Atentem-se que nem sempre foi assim.
Em tempos passados, a Corte Superior entendia que os princípios próprios que abrigavam o direito de família eram exclusivos e que por sua vez não podiam sofrer qualquer interferência de outros princípios de ramos diversos; portanto a responsabilidade civil não deveria ser utilizada nas questões familiares.
Atualmente a visão modificou-se, e poderíamos dizer em uma rota de 180 graus.
Como não existe mais a obrigação de continuidade da relação conjugal ou entre os companheiros, podendo ser desfeita pelo desejo manifestado por apenas uma das partes, em respeito ao princípio da autonomia da vontade e pelo reconhecimento de ser direito potestativo; todavia, o que se deve ter em mente é que não pode haver o abuso no exercício deste um direito.
E pela mesma forma, na relação paterno filial as obrigações devem ser cumpridas e não pode ocorrer qualquer ação que precipite em desrespeito aos deveres paternais e que vão além do adimplemento da pensão alimentícia. Levando-se em conta as normas que asseguram o tratamento de igualdade da filiação, quer seja biológica ou socioafetiva, quando regularizada.
A análise da possibilidade de aplicação das normas da responsabilidade civil sobre o direito de família devem passar pelo crivo dos pressupostos já conhecidos para o seu reconhecimento, a exemplo de conduta antijurídica, culpa, dano e nexo causal.
E em pesquisa sobre o tema responsabilidade civil aplicada ao direito de família na Corte Superior podemos encontrar o reconhecimento do direito a indenização quando ocorrer a omissão da verdadeira paternidade, condenando ao ressarcimento de danos morais neste caso.
Em contra partida não se vislumbrou o dever de indenizar a infidelidade ocorrida no âmbito da sociedade conjugal, como também não houve condenação ao terceiro que participa da relação extraconjugal, mesmo quando estatuído, ainda, o dever de fidelidade em nossa legislação.
É dever, que mesmo desrespeitado não há punição. O Brasil caricato!
Por outro lado, quando ocorrer a transmissão de doença sexual e houver a comprovação de que se deu no âmbito das relações conjugais O Superior Tribunal entende que será possível a indenização por danos morais; e no caso analisado, foi indeferido os danos materiais haja vista que a doença transmitida tem tratamento pelo sistema único de saúde e não restou provada a necessidade material de amparo pela impossibilidade laborativa.
E no que diz respeito a relação paterno filial, tem-se um julgado emblemático sobre o tema, onde já debruçaram inúmeros doutrinadores, e a Corte batendo o martelo entendeu por bem que o abandono afetivo não enseja a reparação pecuniária.
Posteriormente, analisando outro caso em que alegou-se a falta ao dever de cuidado, o Superior Tribunal, com lucidez, entendeu que não existe restrições legais para se aplicar as regras da responsabilidade civil ao direito de família e pontua que o cuidado é um valor jurídico, que se descumprida e comprovada implica em reconhecer a ilicitude do ato, sob forma de omissão.
O não cuidar resulta em direito indenizatório impondo o ressarcimento a título de danos morais; e em conclusão inatacável finaliza:
“Em suma, amar é faculdade, cuidar é dever.”
Mônica Cecílio Rodrigues é advogada, doutora em processo civil pela PUC-SP e professora universitária.