Tudo começou com o encontro de índios com europeus em assimilação cultural. Só que aqueles tinham em ritual de paz ou nos festejos
Tudo começou com o encontro de índios com europeus em assimilação cultural. Só que aqueles tinham em ritual de paz ou nos festejos, embriagando-se com as folhas amassadas in natura e coletivizada em cachimbo comum. Os europeus acharam exótico o seu uso e o espraiou pelas cortes, popularizando a extravagância. Depois o transformou em um charuto, que ficava em uma única boca. Do artesanal à industrialização foi um salto, permanecendo os fumos de rolos nas palhas e os charutos, que passaram a ser riqueza de exportação de certos países latinos. Fumar era socialmente aceito, bacana – pra ficar na gíria da época -, charmoso, era glamour feminino com as suas piteiras, na década de 60. O poder econômico incentivou o seu consumo, e o Estado subsidiou a produção. A propaganda vinculou o cigarro ao sucesso, e os meios esportivos tomaram conta do resto. Quem fuma não fica desequilibrado, nem doido, não é uma ameaça à ordem social, então cigarro neles. Entretanto, quem fuma fede. A roupa fede, o cabelo fede, as mãos fedem e o ambiente também. Quem fica próximo fede também. É um horror. Quem fuma adoece, quem não sabe disso. Mas quem fuma gosta, e quem tenta parar enlouquece. Porque é um vício, portanto, fuma-se ou não se fuma. Não tem como fumar só nos fins de semana, ou ir parando devagarzinho; fuma-se ativamente ou passivamente. A sociedade atual, a reboque dos diagnósticos médicos e pelo imperativo da lei, expulsa de seu convívio os fumantes. É proibido fumar aqui, ali, acolá, quem quiser vá para a sua casa e fume no quintal, ou do lado de fora da janela de seu apartamento. Ninguém se solidariza com o fumante vendo-o como um viciado que precisa de tratamento. Fuma-se porque não tem vergonha na cara para largar de fumar, mas não é bem assim. Qualquer fumante sabe dos malefícios do cigarro, não há ignorância de seus riscos para a sua saúde, e de quem está próximo. Porém, o vício é a doença da dependência que dá prazer. Seja no jogo, no carteado, no bingo, na bebida alcoólica, todos precisam de tratamento, de acompanhamento psicológico para tratar de suas dependências, canalizando-as para uma ação proativa. Todavia, não existem clínicas de tratamento para aqueles que querem parar de fumar. Há para os outros tipos de dependências, que estão em fase de aprendizagem de como lidar com a dependência orgânica. No modelo de saúde no Brasil quem quiser parar de fumar tem que parar na marra ou pelo constrangimento. Por isso que o ex-fumante é um chato. Não porque ele lembra do dia da semana, da hora e do ano em que parou de fumar, mas porque não dependeu de ninguém, sendo desnecessário, portanto a gratidão. O sistema de saúde desampara quem quer parar de fumar e não consegue, e apoia as iniciativas de combate ao fumo por economia por não quer bancar as internações de quem quer parar. É brasa pura quem tenta largar o fumo, e a estratégia social é a marginalização, catapultando-o do coletivo. No entanto, é preciso parar de fumar, mas sem amparo é brasa.