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De repente...

De repente, você se olha no espelho e se percebe não mais um jovem ou uma jovem.

Terezinha Hueb de Menezes
Publicado em 03/08/2018 às 10:18Atualizado em 17/12/2022 às 03:58
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De repente, você se olha no espelho e se percebe não mais um jovem ou uma jovem. Vê, com plácida tristeza, que o tempo passou. Menos para o que se encontra ao seu derredor: você envelheceu, mas a frondosa árvore da rua continua imponente e soberba; você envelheceu, mas o cão amigo, companhia de tanto tempo, late forte como outrora; você envelheceu, mas as violetas, nos pequenos vasos, continuam brotando flores azuis, rosa e brancas; você envelheceu, mas tudo parece imutável à sua volta: as ruas que conduzem à praça, os bem-te-vis que continuam alegrando as manhãs, até aquele pequeno quebrado na calçada se mantém o mesmo.

Você, nã no espanto, percebe-se, exteriormente, com a aparência envelhecida. Busca, dentro de si mesmo, de si mesma, restos da infância: os folguedos infantis, o pique-pega, ao cair da tarde, a amarelinha, buscando, a qualquer custo, o céu; procura, dentro de si mesmo, dentro de si mesma, sobras de uma juventude risonha e descompromissada: o amor nascente, leves esperanças de um futuro alegre e ameno, a certeza de que a caminhada se faria calcando apenas sonhos e ilusões.

O tempo fugiu celeremente. Cambetas, seus passos não conseguiram acompanhá-lo. Você ficou para trás, sem perceber que, como pião, não saiu do lugar, rodopiando seus problemas e seus anseios, no círculo vertiginoso da vida.

Não feche os olhos: se o fizer, não se verá com as faces envelhecidas. Em suas retinas, você se verá jovem, talvez criança, perseguindo, graciosamente, as borboletas dos sonhos, ou a luminosidade de um futuro, transformado vaga-lume, o faiscar verdolengo, convidando-o, convidando-a para segui-lo, no doce engano de caminhos mágicos: “Vaga-lume, seu pai, sua mãe estão aqui.” Enganosamente, você o seguirá, julgando-se por ele seguido/seguida.

Não feche os olhos: nesse cerrar, à sua frente, aflorará um passado que se faz presente, a ilusão de uma volta impossível a tempos e seres que o observam, que a observam, mas que fogem das suas mãos que tentam tocá-los, acariciá-los, prendê-los...

No rodopio da memória, você poderá perder-se. Melhor, pois, de olhos bem abertos, encarar, ainda que tristemente, a realidade em que você se transformou, e dizer com o poeta: “Envelheçamos rindo. Envelheçamos,/ Como as árvores fortes envelhecem,// Na glória de alegria e de bondade,/ Agasalhando os pássaros nos ramos,/ Dando sombra e consolo aos que padecem.”

(*) educadora do Colégio Nossa Senhora das Graças e membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro

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