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Como se fosse gente

Não resta a menor dúvida, ele goza de um invejável privilégio. Privilégio doméstico e social. Tem-se com ele um tratamento de fazer inveja

Padre Prata
thprata@terra.com.br
Publicado em 05/06/2010 às 21:18Atualizado em 20/12/2022 às 06:10
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Não resta a menor dúvida, ele goza de um invejável privilégio. Privilégio doméstico e social. Tem-se com ele um tratamento de fazer inveja. Na maioria das residências ocupa um lugar especial onde é protegido por grades, cadeados, alarmes eletrônicos e outros tipos de segurança, alguns sofisticados. Anda sempre bem lavado, seu proprietário tem vergonha de exibi-lo empoeirado ou com dejetos de passarinhos. Há sempre alguém com xampus especiais para deixá-lo limpo e reluzente. Há gente especializada que é paga para higienizá-lo e dar-lhe polimento adequado. Geralmente leva horas para deixá-lo como merece. Para muitos, suas condições exteriores revelam “status” e o dono sente-se realizado e valorizado. Suas peças são imediatamente trocadas quando apresentam defeito. Se a “doença” é mais séria, há “hospitais” especializados para interná-lo. Examinam tudo, dos calçados à cobertura. Se for preciso, fazem transplante de órgãos, mesmo que isto não fique muito barato. Cada ano são lançados no mercado modelos mais bonitos, mais sofisticados, com maiores recursos eletrônicos. É uma tentação.

Por que amamos tanto esse “personagem”? É porque ele nos traz conforto e resolve uma série de problemas de nossa vida diária. É por causa dessa atração que ele está nos matando. Também eu tenho um carro e sei que estou correndo risco.

Numa de suas crônicas, na Folha de São Paulo, Rui Castro escreveu que “o pior inimigo do homem e das cidades modernas é o carro”.

Disseram-me que Uberaba está com quase 130 mil carros rodando pela cidade, sem contar as motos. Não tenho documentos, foi o que me transmitiram. É de dar susto, um carro para cada três pessoas. Se for exato, o que será de nós daqui a cinco anos? Nosso objeto de estimação vai complicar nossa vida. Atravessar, hoje, uma avenida é um ato heróico. Exige coragem e audácia, visto que o nosso “amigo” está sempre com pressa. O centro da cidade está se tornando um mega-estacionamento. Dois, três ou mais em cada rua. Para acolhê-los com segurança, derrubam casas antigas, testemunhas em pedra e cal de nossa história.   Vão ocupando espaços e atravancando nossos caminhos. Todos os dias, os jornais estampam desastres e mortes. Todo mundo está com pressa, até para morrer. Enquanto eles correm aos milhares, nós todos vamos aspirando seus resíduos tóxicos. A procura do lucro está nos matando, os alimentos industrializados, as drogas, os remédios de duplo efeito, a violência. Nem sequer sabemos mais para onde caminhamos. Como dizia o “seo” Gerald “nossos neurônios estão perdendo a cabeça”.

Antigamente, alguns de nossos antepassados morriam caducos.  Hoje, a maioria morre de Alzheimer, seus neurônios vão morrendo um a um, envenenados. Não sou médico, não sei se é assim mesmo. Pode até não ser. O certo é que estamos sendo envenenados. Isto se não formos atropelados antes. 

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