Há seis anos comecei a visitar os idosos do Asilo Santo Antônio aos domingos, após o meu almoço. Raramente eu deixava de ir, quase sempre acompanhada por minhas filhas, para bater um papinho com eles. Não conhecia nenhum morador de lá, mas, aos poucos, fui me aproximando de uns e fazendo verdadeiras amizades. Foi assim que conheci a Carmelina. Ela chegou de mansinho, com seu livrinho de orações na mão e foi nos cativando com seu jeito simples de ser. Sentávamos em sua cama, abríamos o livro e escolhíamos ao acaso uma prece para um santo padroeiro de alguma causa, e sempre após essa oração, rezávamos um Pai-Nosso de mãos dadas e com muita fé. Esse hábito foi mantido por todo o tempo das minhas visitas e perdura até hoje. Um dia, fui convidada para fazer parte da diretoria do Asilo, e desde então, estou tendo a oportunidade de estreitar meus laços e conviver quase que diariamente com a Carmelina.
Quem é ela? Tem 81 anos, foi criada em fazendas onde o pai trabalhava; aprendeu a ler com vizinhos do fazendeiro; sempre foi pobre; não se casou e hoje só tem uma irmã que mora fora de Uberaba e alguns sobrinhos que moram aqui. Decidiu por conta própria ir morar no Asilo para não dar trabalho a ninguém, e lá ajuda muito na cozinha, descascando verduras e frutas. Carmelina é pura de coração. Desprovida de vaidade, maldade e dotada de uma sabedoria própria dos grandes, ela acolhe, aconselha, reza, deseja só o bem. Continuo me valendo do seu livrinho que tem uma oração para cada necessidade e às vezes sento no seu colo buscando proteção e afeto. Ela é tudo de bom. Sua simplicidade contribui para que o mundo seja melhor. Chego de manhã e pergunto se ela rezou pra mim porque digo que eu escuto quando ela fala meu nome nas orações. Ela ri, com seus dentes faltando, um sorriso maroto, sincero, verdadeiro. De vez em quando saímos para um passeio e foi assim, dia desses, que ela entrou pela primeira vez em um elevador e viu um avião levantar voo.
Fico pensando como seria bom se tivéssemos mais Carmelinas no mundo. Ela não reclama, agradece, é delicada e serena. Tem uma palavra de consolo e de carinho para todas as ocasiões. Perguntei se era feliz e ela me respondeu baixinho que sim, mas que não queria viver muito mais para não dar trabalho pra ninguém. Que diferença das pessoas que não se contentam com nada, que corrompem e são corrompidas, que só enxergam a si mesmas e acham que o mundo tem que se curvar aos seus desejos. Carmelina, você é uma benção de Deus.
