É o título de um filme, se não me engano russo, de anos atrás. Não tem nada a ver com o assunto de hoje. Mas foi dele que me lembrei ao ler, na Folha de São Paulo
É o título de um filme, se não me engano russo, de anos atrás. Não tem nada a ver com o assunto de hoje. Mas foi dele que me lembrei ao ler, na Folha de São Paulo de quarta-feira, uma reportagem política. O jornal mostra a foto de uma missa em que aparecem, em profunda oração, três dos possíveis candidatos às próximas eleições presidenciais. Um deles é declaradamente sem religião. Os outros dois, pelo que sei, não se preocupam com o problema. Parece que a festa está começando. As cegonhas são as mesmas, embora o céu seja outro.
Lembro-me de uma frase de Carlos Heitor Cony: “Para conquistar o poder, tudo é possível.” A política é a arte de esconder o rabo. As raposas mais espertas manipulam as coisas com tal sapiência que enganam até os bem avisados.
As coisas foram sempre assim. Lembro-me das eleições de 1934. Eu tinha apenas doze anos. Na fazenda onde morava, via minhas irmãs ensinando os peões da época a desenharem o nome para que pudessem votar. Mãos duras, calejadas, desenhando, com suor e lágrimas, aquelas garatujas quase ilegíveis. A assinatura do nome dava-lhe o “status” de alfabetizados. Meu pai fiscalizava aquela batalha caligráfica. A ordem do patrão era não votar no Zé Américo. “É comunista. Temos que votar no Getúlio Vargas.” Mas, por essas reviravoltas que acontecem na política, ninguém votou nem no Zé Américo nem no Getúlio. O Congresso provocou o mandato do “Baixinho” por mais quatro anos.
Hoje não consigo entender como meu pai discursava entusiasmado sobre as reformas de Vargas. Falava com incrível desembaraço na criação do Ministério do Trabalho, na criação do instituto de aposentadoria, na assistência médico-hospitalar aos trabalhadores, na regulamentação dos contratos de trabalho, na fixação dos horários de serviço, nas férias remuneradas e o resto de que não me lembro.
Política sempre foi assim. Democracia é apenas o rótulo de manipulação. Por isso é que o marqueteiro tornou-se o elemento principal da arte política. Seria bom se nos apresentassem programas de governo e que escolhessem equipes de apoio de alto nível, de competência e seriedade. Nada disso acontece, tudo entra no velho problema do favorecimento, do cambalacho, da barganha, da tramóia. Eles se arrumam diante dos nossos olhos estupefatos. As cegonhas recolhem-se aos seus ninhos. Voltarão mais tarde.