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A reunião dos bichos

Renato Muniz Barretto de Carvalho
Publicado em 12/10/2019 às 11:57Atualizado em 18/12/2022 às 01:03
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A situação se complicava dia após dia. A convivência estava cada vez mais difícil, as brigas e conflitos se espalhavam por todas as regiões do planeta. Não havia vila ou lugarejo onde não acontecessem confusões, equívocos e arruaças. Volta e meia, ocorriam assassinatos, distúrbios e suicídios. O caos reinava, quebrava-se o tecido social, perdia-se a harmonia entre os entes. Um sociólogo explicou que as relações estavam se rompendo de forma drástica.

Alguma coisa precisava ser feita! Foi então que o elefante tomou a iniciativa de convocar uma grande reunião. Não foi simples decidir o local do encontro, o horário e quem deveria conduzir os trabalhos. Felizmente, a iniciativa vingou. Depois de muita discussão, ficou combinado que a zebra presidiria a reunião, secretariada pela coruja.

Convites foram espalhados pelos quatro cantos do mundo, com apelos eloquentes pelo comparecimento de todos. Da Austrália, vieram cangurus, coalas e o diabo-da-tasmânia. Da China, veio o urso-panda — muito paparicado. Da Índia, vieram macacos, marmotas, tigres-de-bengala e gauros. Da África, vieram leões, girafas, hipopótamos, gorilas e outros tantos representantes da rica fauna do continente. Das Américas, vieram lobos-guarás, lobos-brancos (do Ártico), onças-pintadas, linces, antas, bisontes, lhamas, vicunhas, tatus e tamanduás. Sem contar várias espécies de aves, répteis, peixes, insetos e até baleias e golfinhos. Uma personalidade, o mico-leão-dourado, destacou-se, em resposta a ataque recente provocado por um ratinho.

Os bichos deliberaram bastante, mas não convidaram os humanos, eles que fizessem sua própria reunião. Se fosse o caso, fariam uma reunião conjunta depois.

Os debates se estenderam por vários dias. Muitos bichos se pronunciaram, defenderam ideias, criticaram, avaliaram, pensaram no futuro, falaram, grunhiram, latiram, tossiram, gritaram, baliram, zumbiram, zurraram, uivaram, relincharam, miaram, piaram… Uma beleza! Que diversidade impressionante! Se alguém contasse, ninguém acreditaria. Discutiram direitos animais, poluição das águas, contaminação pelos agrotóxicos, aquecimento global, entre outros grandes temas do momento.

Tudo correu bem até a hora em que alguém propôs a discussão sobre o conceito de “normalidade” em termos de identidade animal. Aí, foi uma bagunça! A zebra defendeu que normais eram suas listras; o tatu disse que normal era viver em buracos; o leão disse que só aceitaria na savana quem tivesse juba; os lobos se desentenderam sobre as cores de suas pelagens; insetos queriam ter reconhecido seu direito de picar qualquer um sem serem esmagados por safanões; peixes exigiram uma inundação geral do planeta. Os bichos foram obrigados a interromper a reunião. Chegaram num impasse perigoso. As hienas riram nervosas, as baleias ameaçaram abandonar o encontro, o rinoceronte saiu dando chifradas, os burros deram muitos coices. Foi uma grande confusão!

Infelizmente, informo aos leitores que eles não chegaram a nenhuma conclusão. Pior, perderam a capacidade de se comunicarem entre espécies. É por isso que, até hoje, além de não se entenderem, também não conversam com os humanos. Muito triste! E os humanos?

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