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A pressa é amiga do diabo

O império da razão idealizado como resolução a todos os males humanos tem mostrado sua face mais sombria

Ilcéa Borba Marquez
ilcea@terra.com.br
Publicado em 31/12/2019 às 09:45Atualizado em 18/12/2022 às 03:11
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O império da razão idealizado como resolução a todos os males humanos tem mostrado sua face mais sombria a ponto de questionamentos prenhes de significados para a atualidade em seus pontos de obstrução. O avanço tecnológico, longe de trazer felicidade, simplesmente acelera o ritmo da vida, encurtando o tempo de forma perceptível para todos. A queixa atual preconiza uma falta de tempo endêmica: não tenho tempo para nada ou ainda não tive tempo... são palavras proferidas por todos e ouvidas ainda com maior frequência. A Tecnologia, produto da Deusa Razão, vista inicialmente como fator de progresso na verdade, aliena o Homem de sua verdadeira natureza. No produto final encontramos alienação, dissociação, destruição do indivíduo e massificação.

O homem, através da tecnologia, foi liberado de muitas ações que seriam intermediárias na sua vida: higienização ambiental e pessoal, cultivo alimentar, criação de pequenos e grandes animais etc. No entanto, o acréscimo ocorrido quanto ao consumo e investimentos sempre crescente em aparelhos de comunicação e lazer inovados anualmente obriga-o a produzir mais para acompanhar as necessidades econômicas pessoais e familiares. Suas horas de trabalho remunerado aumentam constantemente.

Numa reação em cadeia, os movimentos políticos dos séculos XX, tentando adaptação à realidade, propõem o gigantismo do Estado, que nada mais é do que reencarnação dos antigos autocratas destronados que penalizam os mais talentosos, enfatizando a coletividade em detrimento da individualidade e um predomínio do grupo sobre a independência do pensamento e a autoconfiança. Nesta situação acontecem verdadeiros assassinatos aos indivíduos pelas pressões e valores do grupo sobre a razão. Fazem parte desta nova sociedade todos aqueles que jaziam afundados em um nível inferior e agora aparecem convertidos em parte da malta. O homem massificado torna-se perigoso por não pensar, por seu conformismo e uniformidade e, sobretudo, por abdicar da personalidade, permitindo aos demônios que jaziam adormecidos em todo ser humano vir à tona.

Em um episódio da série “Toma lá dá cá” nos surpreendemos com um diálogo entre a nova funcionária da casa e sua proprietária: “Eu poderia roubar, mas estou pedind posso levar este ‘baby doll’?”. Esta é uma típica pergunta que só permite uma resposta, sim! A descrição acima caracteriza a cultura baseado no direito ou direito absoluto sem os correspondentes deveres. Espera-se do Estado aquilo que individualmente não se pode alcançar abrindo a porta à psicologia de massa e à inumanidade. Toda organização em larga escala, incluindo o Estado, é um desastre. Apenas o homem individuado pode resistir ao Estado. 

(*) Psicóloga e psicanalista

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