ARTICULISTAS

Uberaba: Equívocos Históricos (IV) Importância do zebu

Guido Bilharinho
Publicado em 24/05/2025 às 11:06
Compartilhar

Já na ocasião da realização, em 1911, da Exposição de Gado Zebu, a criação, seleção, aprimoramento e comercialização desse gado estavam plenamente consolidadas em Uberaba e região.

Dado isso e a praticamente simultaneidade da decadência comercial da cidade com a ascensão e o predomínio da pecuária zebuína, surgiu e se cristalizou no entendimento de muitas pessoas que o zebu foi o responsável pela decadência comercial de Uberaba.

Isso é dito, redito, publicado, republicado e repetido em conversas, livros e teses universitárias.

Contudo, não passa de grande equívoco, completamente desconectado da realidade, que é onde está a verdade, e não na cabeça das pessoas, consoante o pensador britânico David Ricardo.

A perda da condição de centro comercial de Uberaba decorreu da natureza e conteúdo do próprio comércio, tal qual praticado na cidade, simples entreposto de mercadorias entre litoral e sertão e vice-versa.

Os produtos comercializados nessa atividade não eram locais, não agregando valores. Uberaba perfazia apenas um elo de corrente de transmissão sem poder para interferir, determinar, controlar e influenciar o fluxo que a percorria.

Toda a direção, iniciativa e controle desse continuum comercial era externo, tendo bastado apenas três fatores para afetá-lo, desviando-o definitivamente de Uberaba.

O primeiro deles, a extensão da linha férrea até Araguari, onde chegou em 1896, retirando de Uberaba a condição de fim de linha, de boca do sertão, de chegada e concentração de produtos, de intermediária entre o sertão e o litoral.

O segundo consistiu na paulatina incursão comercial de Uberlândia em Goiás extensível a Mato Grosso, mediante a junção e combinação da estrada férrea e a ligação rodoviária lançada na direção de Goiás, magnificada com a inauguração em 1909 da ponte Afonso Pena sobre o rio Paranaíba.

O Terceiro, a transferência do traçado, já iniciado, da ligação férrea entre Uberaba e Coxim/MT para São Paulo, inaugurada em 1911, cortando abruptamente o comércio da cidade com Mato Grosso, em decorrência de conchavo político entre Rodrigues Alves e Afonso Pena, para este obter o apoio daquele para sua candidatura à Presidência da República.

A pecuária zebuína, aqui produzida, reproduzida aprimorada e selecionada sob absoluto controle local, evitou a decadência e a estagnação da cidade, promovendo seu desevolvimento.

PRIMEIRA VIAGEM À ÍNDIA

O ano da primeira viagem à Índia para buscar zebu tem sido informado em livros, jornais e periódicos como sendo 1898 e, em tese universitária, à sua p. 22, que “em 1906, começou a corrida para a Índia, em busca do gado zebu”.

A primeira viagem, efetuada por Teófilo de Godói, à Índia ocorreu em 1893 e durou um ano. Em 1906 ele fez sua terceira viagem àquele país.

“PRIMEIRO CENTENÁRIO”

DA FUNDAÇÃO DE UBERABA

Num dos livros editados em 2019, já citado anteriormente, publicou-se, à p. 162, que duas entidades “participaram ativamente das comemorações do primeiro centenário da fundação de Uberaba, ocorrido em 13 de fevereiro de 1911”.

As entidades realmente participaram e as comemorações citadas também ocorreram. Só que equivocada e indevidamente. Como todo mundo erra, consta que Borges Sampaio considerou a instituição do Distrito de Índios, em 1811, como materialmente efetivada. Nessa esteira, embarcou também Hildebrando Pontes, que sugeriu, pleiteiou e ajudou a promover a legendária Exposição de Gado Zebu de 3 de maio de 1911, a título de comemoração desse centenário.

Acontece que, além de não se encontrar até o momento o documento público atinente a essa criação, distrito de índios na época não era localidade, mas região, apenas delimitada e fixada em documento e mapa, não na prática.

Comemorou-se, portanto, um centenário indevido ou, quando muito, no caso de se referir à região, sem muita importância.

UBERABA ENTREPOSTO COMERCIAL

Na tese universitária, anteriormente referida, à sua p. 22, escreveu-se que “desde 1889 a cidade de Uberaba era um importante centro de distribuição de insumos do país”.

Além de não ser de distribuição, mas apenas de interposição de mercadorias vindas e remetidas ao litoral, essa prática inaugurou-se ainda na década de 1820, quando o major Eustáquio desviou a via Anhanguera para Delta, criou o porto de Delta e estabeleceu a navegação pelo rios Mojiguaçu e Grande, firmando importante rota salineira.

MAJOR CESÁRIO

Uma das pessoas mais notáveis de Uberaba, Antônio Cesário da Silva e Oliveira Filho (major Cesário) foi objeto de duas desinformações em livro editado em 2019.

1 – Uma, de que foi advogado na “célebre demanda movida pela Câmara Municipal de Uberaba contra a Igreja Matriz”. Certo que ele foi advogado da Câmara. Só que não foi a Câmara que moveu ação contra a Igreja. Foi o contrário. A Fábrica da Matriz, representada por monsenhor Inácio Xavier da Silva (por sinal, ex-agente executivo), é que teve essa iniciativa, porém, não em 1908, como dito no livro, mas em 1909.

2 – Na mesma página do referido (e, aliás, excelente livro), publicou-se que Cesário “tornou-se o único deputado de Uberaba na Assembleia Mineira durante o período do Império”. Não foi. Antes dele o foram o vigário Silva e o barão da Ponte Alta e, provavelmente na mesma década, Joaquim José de Oliveira Pena, que também integrou o Senado Mineiro.

Guido Bilharinho

Advogado em Uberaba e editor das revistas culturais eletrônicas Primax (Arte e Cultura), Nexos (Estudos Regionais) e Silfo (Autores Uberabenses)

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Logotipo JM Magazine
Logotipo JM Online
Logotipo JM Online
Logotipo JM Rádio
Logotipo Editoria & Gráfica Vitória
JM Online© Copyright 2025Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por