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Sabidamente inverídica

Ana Maria Leal Salvador Vilanova
Publicado em 03/10/2022 às 19:00Atualizado em 16/12/2022 às 00:41
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Alguém deveria declarar sabidamente inverídica essa história de que chocolate engorda. Está difícil controlar o peso! Um chocolatinho aqui, outro ali, no final, resulta num montão, e as calorias não perdoam, daí a necessidade.

Já agora, declarem o açúcar, em geral, um ingrediente não engordante. Pode usar qualquer tipo, seja de cana, beterraba ou mesmo derreter uma rapadura, está valendo tudo. Ninguém vai ganhar peso, uma vez que se declare sabidamente inverídica essa capacidade.

E, para melhorar a saúde em geral, declarem que cada pessoa é 100% senhora do seu corpo e, além da porcentagem de gordura baixinha, podem proclamar a quantidade de músculos que quiserem. Inclusive, podem entrar no concurso Mr. Músculos apenas com uma declaração da sabida inveracidade daqueles indesejáveis índices. Corpo emaciado? Com excesso de gordura? Músculos de geleia? Seus problemas acabaram. É tudo inverídico, como sabidamente se sabe. Basta que se declare a inveridicidade fatal.

Como, também, podem declarar muito sabidamente verídica ou inverídica qualquer condição, permanente ou temporária, individual ou coletiva, real ou imaginária, desde que a referida declaração seja declarada solenemente, atestando, assim, a veracidade da declaração, ou sua inveridicidade total, que tal não seria, não tivesse sido assim declarada.

Está decretada a infalibilidade pública, portanto, se você encontrar um vegetariano oficial no supermercado, não estranhe se, depois de o ver comprando legumes e verduras, bolonhesa vegana, feijoada de tofu, carne de jaca, hambúrguer de soja, croquete de palmito, e temperos adequados, testemunhar que, na saída, ele passe no açougue e leve um quilo de picanha.

Não pense nada. Não se pergunte se o seu amigo comprou a carne para outra pessoa, está passando por um momento de fraqueza, deixou o vegetarianismo para trás, ou se aquilo não é picanha. Ou, se quiser pensar, guarde para você mesmo. Mas não se atreva a falar, muito menos a escrever, menos ainda no WhatsApp.

Na fila do caixa, fale sobre o tempo. Ou melhor, não. Não se sabe ainda qual é a veracidade sabida e declarada sobre o assunto, assim, melhor se calar e pensar como eram estranhos os tempos da ditadura.

Ana Maria Leal Salvador Vilanova

Engenheira civil, cinéfila, ailurófila e adepta da caminhada nórdica

 

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