ARTICULISTAS

Resistência Cerâmica

Ana Maria Leal Salvador Vilanova
Publicado em 21/12/2022 às 17:56Atualizado em 26/12/2022 às 22:53
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A família se recusa a ter contato com um certo tipo de recipiente cerâmico. Não compra, não usa, não presenteia. Na mesma região, muitas famílias fazem o mesmo e mantêm a casa livre da indesejada olaria. Já em outras paragens, alguns quilômetros para lá, ou para cá, outras pessoas aderem à nova tecnologia.

Este é apenas um detalhe prosaico do mundo há dois mil anos. As peças em questão, utilíssimas, tinham uma caraterística definidora: vinham das forças ocupantes. Quem aderia estava comunicando ao mundo sua assimilação aos costumes greco-romanos. Mas havia aqueles seres estranhos, vindos da Judeia e outros igualmente remotos, que não compravam nada daquilo, nem real, nem metaforicamente. Obrigadinho, mas ficamos com os nossos potes, e tchau.

Era uma forma de participar da guerra cultural da época. Eram povos ocupados, debaixo de leis injustas, que pareciam favorecer uns e cair implacáveis sobre outros, dependendo dos favores do chefe de plantão.

Com certeza, naqueles dias houve grandes campeões esportivos, de competições memoráveis, históricas mesmo. Também havia, como largamente documentado, tiranos para todos os gostos. Desde aqueles que não gostavam de comentários à sua aparência até os que mandavam bebês à morte, antes ou depois do nascimento. Parece que foi ontem.

O fato é que daqueles tempos, e daquela região, veio uma inovação, uma boa-nova, que continua tão fresca como no primeiro dia. E, se algo mudou, foi a urgência da sua necessidade. Para a história humana, é uma piscadela, ainda que a cada dia haja essa impressão de que o agora é esmagador, interminável.

Na dúvida, pode-se refletir. Quem será lembrado daqui a dois milênios? Ou dez? Ou vinte? Quem vai “vencer” a batalha pela humanidade? A força bruta leva vantagem no imediato, mas não é, absolutamente, sustentável.

Já a verdade eterna, ainda que nascida num lugar desimportante, no meio de pessoas subjugadas, é imparável. Sempre haverá déspotas que podem tentar conquistar tudo, levar as riquezas todas. Mas, também, sempre haverá um pote de cerâmica, um pedaço do dia, uma pequena parte das infinitas atividades diárias, em que se poderá resistir e crescer.

Feliz Natal para todos. Mais que nunca, desejos de uma autêntica paz, nas verdades eternas e no amor infinito.

Ana Maria Leal Salvador Vilanova

Engenheira civil, cinéfila, ailurófila e adepta da caminhada nórdica

 

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