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A-mor

A proposta a ser construída hoje é, basicamente, uma agressão à língua materna, principalmente sob o ponto de vista de grandes gramáticos e literatos

Savio Gonçalves dos Santos
Publicado em 08/04/2013 às 08:46Atualizado em 19/12/2022 às 13:47
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A proposta a ser construída hoje é, basicamente, uma agressão à língua materna, principalmente sob o ponto de vista de grandes gramáticos e literatos. Entretanto, para amantes da filosofia heideggeriana (Martin Heidegger, filósofo alemão contemporâneo), o jogo com a linguagem não é novo, nem estranho, em se considerando termos como ser-no-mundo, ser-com-os-outros, ou mesmo, ek-sistência.

Ao tomar a palavra amor, “ferindo-a” com hífen, na verdade o que se objetiva não é uma afronta, ou a criação de um neologismo, apesar de já o fazer; mas sim o que se pretende é perpetrar uma explicação incomum acerca do amor, suas práticas e alcances.

Tradicionalmente, amor tende a representar o prazer extremo que se sente, aliado a capacidade racional, permeada pelo vínculo emocional. Entretanto, amor é muito mais que uma simples representação humana, ou mesmo uma configuração gramatical sustentada pela lógica filosófica e explicações psicológicas. O amor é, de fato, a-mor.

Ao se tomar a linha da gramática portuguesa, sabe-se que, em alguns casos, a vogal a, apresentada como primeira letra de uma palavra, funciona como partícula de negação e, portanto, neste caso, o a-mor é justamente uma negação de mor. O mor, aqui colocado como sufixo, se refere à constituição valorativa de uma sociedade, o que se convencionou chamar de moral. Assim, o a-mor se apresenta como uma forma intensa de negação da moralidade imposta, para a construção de uma nova forma de ser, sentir, pensar, agir, a-mar...

O a-mor é algo intenso; é muito mais que sentimento, pois é o único que inebria a alma! O a-mor provoca anomia, transforma o ser humano num completo ente sem referências! O a-mor nega as regras propostas, não no sentido de desordem, mas na proposta de uma anarquia sentimental e psicológica, onde não há referências, pois tudo é novo e velho! O a-mor é a possibilidade da contrariedade física; não se prende a matérias, tempos e espaços, mas foi, é e será! É multiforme, mesmo sendo amórfico; é anacrônico e cronológico; é paradoxal e axiomático. É e não é... numa contrária disposição filosófica que, ao mesmo tempo, instaura o primeiro passo para a filosofia: o espantar-se! O a-mor é a-mar; é negar para afirmar, e afirmar para negar. É desconstruir, para construir, e construir para desconstruir. É chegada e partida. Princípio e fim.

A proposta do a-mor não se sobrepõe a nenhuma lógica já construída, nem pretende questionar princípios e teorias. Mas propõe uma mudança para o humano que dispõe de tão nobre capacidade e sentimento, e não sabe como utilizá-lo, nem sua magnitude. O a-mor, o a-mar, quer ser uma lógica ilógica do ser e do sentir; numa construção que desconstrói, que está posto para que a renovação seja possível. Para que a rotina não alcance a humanidade. Para que o a-mor não se torne meramente amor, como algo simplesmente sentido pela difícil missão de ser humano. A-mar e ser a-mado.

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