Voltaire num de seus livros, “O Ingênuo”, critica os usos e costumes da vida social. Trata-se de um índio canadense trazido para a Europa
Voltaire num de seus livros, “O Ingênuo”, critica os usos e costumes da vida social. Trata-se de um índio canadense trazido para a Europa. Ao ser batizado, apaixonou-se pela madrinha e estranhou não poder casar-se com ela. Ao casar-se, com as devidas licenças, estranha a presença de tabeliões, testemunhas, contratos, dispensas e assinaturas. Pensa: “devem ser todos uns patifes para exigir tantos juramentos e tantas testemunhas”.
Conclui-se que o homem, até certo ponto é um produto do meio e da cultura em que vive. Sofre uma influência, às vezes incontrolável. Seria só do meio?
Aí entra Rousseau e diz que o homem nasce bom, puro, é a civilização que o corrompe. Hobbes acha o contrário, afirma que o homem é um lobo por natureza, é um animal bravio que devora o semelhante.
A confusão não para aí. Aparece outro para dizer que o homem nasce programado, já com sua vida preestabelecida. Programado para sofrer, para ter um câncer, para passar fome, para dar um tiro no ouvido e outras desgraças. Já nasce devendo. Difícil aceitar esse destino tão carregado de pecados a pagar. Não combina com a misericórdia de Deus.
Outros nos ensinam que nascemos carregando as consequências de uma desobediência de Adão, um progenitor lendário, primitivo. Não cumpriu o que lhe foi mandado, pecou e transmitiu seu pecado para todos seus descendentes, por via da união sexual. Difícil também.
O que não podemos nos esquecer é de que, embora racionais, dotados de consciência, nascemos animais. Nascemos com o peso de nossos instintos de animais que nos fazem seguir rotas estranhas e caminhos tortuosos. Usamos do dom da liberdade que Deus nos concedeu para agredir nossos irmãos com artigos agressivos, destemperados, mal-educados, notinhas venenosas humilhando os que estão sofrendo. Achamos que nós somos os puros, os que não erram. É difícil dominar nossos recalques.
Não existe destino, o que existe é mau uso de nossa liberdade. Não podemos vencer-nos sozinhos. Precisamos da ajuda de Deus, de sua Graça, de sua presença, de sua misericórdia. “Sem Mim nada podeis fazer”.
O centro da pregação de Jesus, o núcleo de seu projeto de vida, o que Ele chamou de Reino de Deus, traz para o nosso comportamento exigências fundamentais. São colocadas diante de nós para nossa livre escolha: amar a Deus acima de todas as coisas, amar ao próximo como a nós mesmos, perdoar aos que nos ofendem e nos agridem, compreensão, tolerância, humildade, justiça, serviço prestado aos outros sem preocupações com retorno. Se eu não lutar para dominar meus instintos, eu me afasto livremente de minha salvação. Já foi dito que “Deus que me criou sem mim, não me salva sem mim”.
Os homens, com suas teorias, só complicam as coisas e acham que, se não sofrermos muito, não nos purificaremos de nossos erros. Deus não nos condena ao sofrimento, aos desastres, às misérias humanas, à dor e à angústia.
Por que não acreditar que Deus nos salva porque Ele bom, é Pai? Ele nos ama e nos perdoa. Ele nos aceita como somos, seres frágeis e carregados de instintos destruidores. “Eu não vim salvar os justos, mas os pecadores”. Não estamos aqui como juizes implacáveis, mas como irmãos que toleram, compreendem e perdoam uns aos outros.