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A celeuma que a própria lei criou

O jurisdicionado tem a expectativa que a lei sempre vem para resolver os imbróglios...

Mônica Cecílio Rodrigues
Publicado em 18/12/2017 às 07:13Atualizado em 16/12/2022 às 08:03
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O jurisdicionado tem a expectativa que a lei sempre vem para resolver os imbróglios que ocorrem na vida do cidadão.

Ledo engano!!

A experiência obtida no exercício da profissão é que muitas vezes a complacência da lei a certos acontecimentos gera situações conflitantes com a moral e a ética, principalmente no direito de família. E que acabam resultando em litígios a serem resolvidos nos tribunais, onde nem sempre se faz justiça.

Um destes exemplos é a permissão expressa da lei para a composição e o reconhecimento da união estável com pessoa casada, que se achar apenas separada de fato, sem existir termo final da sociedade conjugal, vigorando ainda o regime patrimonial e ainda em mancomunhão, ou seja: não houve partilha dos bens.

A constituição de união estável implica em regime patrimonial, o que por via de consequência traz efeitos jurídicos econômicos aos envolvidos, denominados pela lei de conviventes.

Entretanto, se a legislação permite a união estável a pessoa casada que está apenas separada de fato, não existindo termo final comprobatório para a dissolução da anterior sociedade, mesmo que matrimonial, poderá haver uma confusão patrimonial entre todas as pessoas envolvidas. Pois como os bens ainda se encontram sem divisão pode uma partilha futura resultar em prejuízo a aquele cônjuge que efetivamente participou da aquisição.

Traduzindo em miúdos: uma vez estabelecida a união estável com pessoa que ainda não “providenciou” a partilha de bens, quer seja de um casamento anterior ou até mesmo de uma união estável, no futuro, quando da dissolução desta união de que se trata poderá haver uma confusão patrimonial com bens adquiridos anteriormente e que ainda não foram partilhados.

Dito e efeito, restou a nossa Corte de Cassação a solução pacificadora a um caso concreto e caracterizado de uma união estável ulterior a um casamento, este ainda sem ter ocorrido partilha de bens, onde se pretendia a “bendita” partilha dos bens entre os conviventes.

Ora senhores leitores, o processo se arrasta desde de 2010, onde comprovadamente verifica a existência de uma união estável entre os demandantes e, logo, a necessária partilha de bens; todavia, de outro lado ainda coexiste um casamento, sem dissolução e sem partilha de bens, com a reconhecida esposa, que nem sequer participa processualmente desta contenda.

Um matrimônio sem partilha coexistindo com uma união estável!

Apesar da possibilidade jurídica é necessário reconhecer que a solução de uma relação poderá interferir na outra, na questão patrimonial; assim, prudentemente, para que não ocorra decisões contraditórias e prevenindo qualquer ilegalidade na divisão do patrimônio, uma vez que as sentenças proferidas não se contradigam, e que um patrimônio não atinja o patrimônio da outra, o Superior Tribunal de Justiça decidiu, sabiamente, que é necessário a participação da, ainda, cônjuge, no processo.

Dai a lição que se tira da confusão que a legislação criou com a possibilidade de constituir uma união estável quando se está apenas separado de fato.

A lei deve ser feita não só com uma visão apriorística dos fatos, mas também prospectiva, sob pena de sua permissividade causar um problema maior do que a solução dada.

Porque, mesmo sendo possível a união estável de pessoas ainda casadas, deve-se acautelar que esta admissibilidade poderá trazer maiores dissabores quando ainda existir mancomunhão anterior, devendo estar ciente os cônjuges deste problema e assim providenciar a partilha de bens, mesmo que seja na forma ideal.

Dra. Mônica Cecílio Rodrigues

advogada, doutora em processo civil e professora universitária

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