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Presente de Natal

Gilberto Caixeta
Publicado em 03/08/2018 às 10:18Atualizado em 17/12/2022 às 04:21
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Há aqueles que vêem o Natal com olhar de prece, um cantinho da oração, um cântico de louvor ao Cristo-Menino, uma pausa de reflexão pessoal onde tudo cabe dentro do “vasto mundo” pessoal. Outros gostam de dar presentes aos amigos, as crianças, a esposa não embevecidos no consumismo, no crédito, no comemorar porque é Natal. Há presentes de todos os quilates, no entanto, os mais preciosos são os inesperados, os inusitados quando não somos crianças, porque elas adoram presentes que encantam aos olhos.   

Tiveram a idéia de viajar ao passado e concretizaram-na em final de semana. Retornar aos locais onde nasceram e cresceram configurou-se como um presente de recordações, que poderia suavizar o viver, acolhendo o passado, revitalizando a memória de que a vida não pode ser regida por uma relação de dor e ódio.

A viagem é um acolhimento à história pessoal, pensaram; é o confirmar de que o destino conspira com a vida e a ela está vinculado; dispensando fórmulas maniqueístas de explicações. Viajar ao passado é se acolher, é deixar de ser rebelde construtor de sofrimentos e passar a ser obediente construtor de felicidades, concluíram.

A viagem transcorreu com tranquilidade. Ao chegarem ao destino, a prioridade foram os locais onde cada um nascera, e coube ao pai o roteiro turístico e os seus relatos.

O guia honrava-se com os seus guiados; estes, com o guia, e ambos, com a idéia que os puseram juntos, devolvendo-lhes o começo. Era, realmente, Natal.

Viver é um ato de coragem construtiva. Viver só por viver, sem foco, é se acovardar às oportunidades, é não permitir que o dom da vida se revele. Tudo que advém de nós e o que criamos são de responsabilidade pessoal. É como o menino que, ao ver a bola, dá-lhe um chute; a trajetória percorrida pela bola é de responsabilidade de quem a tirou da inércia. Não é muito diferente da vida adulta. Quando saímos de nossa inércia e chutamos um projeto pessoal, quem responde pela trajetória somos nós. Isso não é individualismo ou altivez disfarçada de humildade, mas responsabilidade pessoal pelas coisas realizadas. É fé no destino que traçamos.

Os turistas passearam pela cidade, foram à praça da infância e, as suas mentes, se viram como crianças, correndo de um canto para o outro, soltando palavras de ordem e correrias de pernas sem perdê-las. A cada rua, a cada esquina, havia o passado transubstanciado em lembranças acalentadas no peito, que às vezes podem ser dores ou alegrias, mas que dispensam qualquer forma de prazer que não seja a oriunda da memória.

Diferentemente de quem quer no presente o passado, pode se envenenar com as ilusões instrumentalizadas nas ambições pessoais, na busca de poder e prestígio, na riqueza acima dos valores humanos. A memória é a fórmula vitoriosa do massacre ao orgulho, à inveja, à ingratidão. É se acolher na melhor das acepções filosóficas; é impedir o mando da lassidão que nos arrasta preguiçosamente para o funeral da depressão.

Os nossos protagonistas anônimos, ao final do dia, oxigenaram as lembranças, expulsaram o medo, comemoram o presente de Natal que se deram. Sem “ho, ho, ho!”, sem trenó puxado por renas, guloseimas regadas a álcool. Não viveram a pressão do consumismo, do estender de mãos em épocas convencionais; deram-se de presente, entregaram-se ao presépio do renascimento, sem sofrimentos, desejando um Feliz Natal.

(*) professor

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