Ando muito desconfiado de que estou ficando ultrapassado, démodé. Sou da época em que qualquer família
Ando muito desconfiado de que estou ficando ultrapassado, “démodé”. Sou da época em que qualquer família educada ensinava o filho a se portar à mesa. Hoje contemplo as coisas muito mudadas. No geral, mais tolerantes, desde o modo de se falar ao próprio jeito de se agir cotidianamente, tudo numa feição vulgar que quase não distingue o educado do comum. Com efeito. Recentemente, testemunhei um fato insólito. Estava hospedado numa estilosa pousada, até renomada pelo padrão de qualidade, quando dois rapazes chegaram e ocuparam a mesa ao lado para o almoço. Logo ali, qual não foi minha surpresa? Um deles colocou sobre a mesa, ao seu lado, um par de tênis, usado e sujo. Assustei-me. Pensei. Que maneira mais porca de se marcar lugar. Daí lembrei-me de que, ao tempo da minha infância, as mães até colocavam livros sob os braços dos filhos para se treinar almoçar de “asa fechada”, evitando-se incomodar o vizinho à mesa. Tempo que se foi. Afinal, o rapaz serviu-se e almoçou com o par de tênis sobre a mesa, sem qualquer constrangimento ou embargo, nem mesmo do seu amigo. Era como se fosse mais um conviva. Convenhamos. Tudo pode evoluir. A tolerância, reconheço, até socializa, mas higiene é higiene. Tive um íntimo impulso de advertir, de pedir ao garçom que o fizesse. Recuei. Tão evidente o desvio aos olhos de todos, e tanta indiferença ante o ato que, certamente, o censurado poderia ser eu. Na cabeça do rapaz, seguramente, não ecoava a voz de sua mãe, como ressoa sempre soprando perene em minha mente: “Olha os modos meu filho!” Tempos que mudam.
(*) Juiz de Direito