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DESABAFO DE UMA CONCURSEIRA

Desde que me formei em Direito, há três anos e meio, dedico-me aos estudos para concursos públicos

Júlia Garcia Baptistuta
Publicado em 11/09/2017 às 16:57Atualizado em 16/12/2022 às 10:36
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 Desde que me formei em Direito, há três anos e meio, dedico-me aos estudos para concursos públicos. Meu sonho é ser servidora pública. Tem gente que acha que isso é "vida boa". "Mas você só estuda?". Essa pergunta é feita com frequência para muitos concurseiros. Sim, eu só estudo. Contudo, a questão desconhecida pela maioria das pessoas é que "só estudar" é muito mais difícil do que "só trabalhar". Quem só estuda é chefe de si mesmo, em trabalho sem remuneração e sem limite máximo de jornada. Não tem férias, não tem auxílio-doença, não tem repouso semanal remunerado. É vida dura, luta diária, abdicação, privação. É a busca por um sonho que, talvez, nem será concretizado. Nesses três anos e meio, nos quais mais tenho me visto como "concurseira" do que como "Júlia", muita coisa aconteceu.

Tenho orgulho da minha trajetória de dedicação e luta. Já chorei muitas vezes pela ausência do meu nome na lista de aprovados, mas também já comemorei pela presença dele. É uma sensação de recompensa indescritível. É mérito. Uma das melhores sensações que tive foi no concurso da Prefeitura de Uberaba/MG, minha cidade. Lembro-me perfeitamente que deixei de viajar com minha família no Natal, pois precisava estudar. Foi todo mundo, menos eu. "Valeu a pena", pensei, quando saiu o resultado. Passei em segundo lugar para o cargo de Analista de Auditoria da Saúde e, em terceiro lugar, para o cargo de Analista de Direito. Contudo, hoje, tenho minhas dúvidas se valeu a pena. Mais de um ano depois do resultado, ninguém foi nomeado para os cargos. Ao revés, para cargos em comissão de "assessor jurídico", com atribuições equivalentes aos cargos para os quais fui aprovada, já houve diversas nomeações. Falta dinheiro para nomear os aprovados no concurso, mas, para os comissionados, sempre tem um "jeitinho".

Segundo o STF, cargos em comissão devem ser usados apenas para funções de chefia, sob pena de inconstitucionalidade. Será que esses "assessores jurídicos", na realidade dos fatos, possuem função de chefia, ou o Município vem utilizando cargos em comissão para nomear "apadrinhados", em extrema violação à Constituição Federal, especialmente aos princípios da impessoalidade, moralidade e eficiência? Essa opção por comissionados em detrimento dos aprovados no concurso público é triste e revoltante! Isso sem comentar o recente escândalo, na cidade, de nomeação para cargo em comissão em troca de favores sexuais. Tem dia que penso em marcar um horário com o sr. Prefeito e contar minha história de luta (e de todos os concurseiros), pra ver se ele muda de ideia e passa a seguir o texto constitucional, optando por nomear pessoas que foram aprovadas em concurso público por competência e mérito. Será que um dia teremos um país pautado na meritocracia e não apadrinhamento? Tenho fé que sim. É essa crença que me move a continuar estudando. Quem tem sonho real de ser servidor público, é gente forte e guerreira. É gente que quer vencer na vida por mérito. É gente teimosa, que não desiste no primeiro, nem no último obstáculo.

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