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A vedação ao retrocesso social

Mônica Cecílio Rodrigues
Publicado em 24/03/2019 às 21:33Atualizado em 17/12/2022 às 19:17
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Em recentíssima alteração da nossa legislação civil, o casamento que antes era permitido, excepcionalmente, aqueles que ainda não haviam alcançado dezesseis anos, para o fim de evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez, hoje não é mais possível.

Pelo que vejamos:

Como as normas legais se pautam pelos valores do seu tempo, as mudanças axiológicas que ocorrem acabam por influenciá-las em seu nascedouro ou em suas modificações.

Todavia, s.m.j., por vezes nos deparamos com modificações legislativas que não correspondem a necessidade premente do cidadão; ou por outras vezes vai de confronto aos direitos já conquistados por estes.

Com relação a proibição recente de que não será permitido, em qualquer caso, o casamento de quem não atingiu a idade núbil, ou seja, aos menores de dezesseis anos, deve ser recebida com ressalva.

Simplesmente porque, em uma primeira análise, a permissão que outrora existia para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal realmente não coaduna com a atitude de conceder a constituição de uma família para esquivar o réu de uma punibilidade.

Pois algumas das vezes estamos expondo a vítima ao duplo risco só para poupar da pena o criminoso.

Já em uma segunda análise, podemos, cautelosamente, dizer que houve um retrocesso ao direito que já existia aqueles que tinham a intenção de formar uma família através do matrimônio; todavia, em razão de não terem alcançado a idade núbil (16 anos) a lei permitia, apenas exigindo-se autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais.

E hoje?

Hoje, não mais podem desejar a constituição desta família pelo casamento, em razão da expressa proibição legal.

O que de fato acontecerá com aquele casal que resolveu, ainda na adolescência, ter a prole e não poder contar com a regularização da família?

Porque não poderão também constituir uma união estável, através do contrato, frente a incapacidade civil que enfrentam. E a solução não seria a emancipação, pois ela só poderá ocorrer se o menor já tiver dezesseis anos. E nesta idade o menor já pode se casar, desde que com autorização dos pais ou legal.

Portanto, o que se pondera aqui e pode-se dizer que houve um retrocesso ao direito de se casar antes dos dezesseis anos em razão da gravidez, com a permissão de ambos os pais, ou de seus representantes legais.

E como ficará a constituição desta família (?), é a pergunta que não cala.

Um dos princípios do direito de família é a proibição ao retrocesso social, haja vista que é constitucionalmente garantida a proteção as entidades familiares que assim merecem.

Esta família, reconhecida de fato como família, não tem mais proteção legal.

E o Estado não poderia jamais se abster desta proteção, mas repita, principalmente quando existe uma garantia constitucional de proteção e reconhecimento, repete-se, s.m.j., com a proibição do casamento esta família está ao desabrigo legal e, entretanto, os seus componentes já são reconhecidos como sujeitos de direito.

A vedação ao retrocesso social é amplamente aplicada as causas de família em nossa Corte Superior, e deveria, por via de consequência, ter o nosso legislador atentado para este princípio. Pois não será esta proibição legal do casamento, dito infantil, que impedirá uma gravidez ocorrida precocemente.

Então qual a finalidade da proibição?

Mônica Cecílio Rodrigues é advogada, doutora em processo civil e professora universitária. E-mail: [email protected]

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